sexta-feira, 27 de setembro de 2019

O direito de o acusado falar por último



Regra universal de processo penal, nossa Suprema Corte despendeu horas debatendo-a. Uma questão política conduziu a esse desforço incomum. Disseram os ministros que se tratava da questão mais importante na história do Tribunal.

Não por sua conotação jurídica, que é muito simples; mas por sua repercussão política e eticossocial, uma vez que os erros dos juízes de piso podem comprometer sentenças como, por exemplo, as da Lava-Jato.

O esforço contra a corrupção seria, em parte, retardado. Isso porque os processos não voltarão à estaca zero, mas recomeçarão do ponto em que os juízes deliraram daquela regra, que emana dos valiosos princípios constitucionais do contraditória e da ampla defesa. Algo menos trágico do que o apregoado pelaí.

O acusado fala depois de ser acusado. Defende-se, respondendo. Não é o elementar?

No processo julgado, como em vários outros, acusados "delatores" deveriam, primeiramente, deixar bem clara qual seria a delação. Depois disso, o delatado ergueria seu escudo defensivo. No entanto, os juízes erraram, incluindo-se o grande patriota, magistrado Moro. No afã de acusar e condenar a qualquer preço, determinaram que acusadores delatores e acusados delatados produzissem suas razões de forma simultânea, em vez de sucessivamente. Claro que em prejuízo da defesa, materializado simplesmente na condenação.

Inverter a ordem legal dos processos para combater a saúva da corrupção no Brasil, que Rui Barbosa já denunciava, não é bom caminho. Nas Faculdades de Direito, quando estudamos processo civil e penal, passamos a saber que são uma sucessão de atos continuados e lógicos destinados à prolação de uma sentença pelo juiz.

Subverter esses princípios é justicialismo. Desordem oposta a desordem potencializa a desordem. Por isso, sabendo, pelo "The intercept", das maquinações da Lava-Jato, os corruptos brasileiros ganharam mais coragem, ao ver que não desenvolvemos ações civilizadas contra os ataques ao erário, mas uma briga pela repartição dos butins esparsos.

O Supremo fez retornar-se ao bom combate, por meios dos princípios de nosso Estado de Direito Democrático. Se alguém deve pagar, são os juízes de primeira instância, despreparados ou imbuídos de vontade de cunho fascista para ordenar nossa sociedade, algo que a história diz que termina com gente pendurada em árvore, e implica em guerras de milhares de moços esvaídos em sangue. Que redobrem seus cuidados os juízes - e conhecemos significativa parte que vive para a ciência do Direito no sacerdócio da honestidade. Quem não deve ser responsabilizado é o Supremo Tribunal Federal, que simplesmente fez valer a Constituição.

Amadeu Garrido de Paulaé Advogado, sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados.


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