Fabrício Carpinejar
Mineiro é humilde, e posso provar.
Porque teria todos os motivos para ser arrogante e não é.
Porque teria todos os argumentos para se sobressair no país, mas permanece na sua, quietinho, come-quieto.
Porque teria todos os pretextos para contar vantagem, e é adepto de longos e enigmáticos silêncios.
Pense no maior jogador de futebol de todos os tempos: Pelé, mineiro de Três Corações.
Pense no maior inventor de todos os tempos: Santos Dumont, pai da aviação, mineiro de Palmira.
Pense no maior poeta brasileiro: Carlos Drummond de Andrade, mineiro de Itabira.
Pense na maior poeta brasileira: Adélia Prado, mineira de Divinópolis.
Pense no maior prosador brasileiro: João Guimarães Rosa, mineiro de Cordisburgo.
Pense na escritora com a maior história de superação: Carolina Maria de Jesus, mineira de Sacramento.
Pense nos maiores símbolos de liberdade: Chica da Silva, mineira de Diamantina, e Joaquim José da Silva Xavier (Tiradentes), mineiro de Ritápolis.
Pense na maior cantora da MPB: Clara Nunes, mineira de Caetanópolis.
Pense no maior artista brasileiro: Aleijadinho, mineiro de Ouro Preto.
Pense no maior compositor brasileiro: Ary Barroso, autor de Aquarela do Brasil, mineiro de Ubá.
Pense no maior cartunista brasileiro: Ziraldo, mineiro de Caratinga.
Pense no maior cientista brasileiro: Carlos Chagas, mineiro de Oliveira.
Pense no maior ativista dos direitos humanos nascido no Brasil: Betinho de Souza, mineiro de Bocaiúva.
Pense no maior expoente do espiritismo: Chico Xavier, mineiro de Pedro Leopoldo.
As quinze personalidades mencionadas são, incrivelmente, de cidades diferentes de Minas Gerais, mostrando a diversidade exuberante, o universo eclético, a força messiânica das profundezas do interior. Nenhuma delas nasceu na capital, Belo Horizonte. Isso também tem relação com o fato de Minas ser o estado com mais municípios no país — 853 localidades.
Haveria outros predicativos para o mineiro ostentar uma mania de grandeza, mas ele prefere deixar de lado: a terceira maior cachoeira do Brasil está em Minas, a Cachoeira do Tabuleiro, em Conceição do Mato Dentro, considerada uma das 7 maravilhas da Estrada Real; três dos cinco maiores picos do país estão em Minas, incluindo o Pico da Bandeira; a maior estalactite do mundo está em Minas, apelidada de Perna da Bailarina, localizada na Gruta do Janelão, no Parque Nacional Cavernas do Peruaçu, entre Januária e Itacarambi; Minas tem o maior acervo no país reconhecido pela Unesco como Patrimônio Cultural da Humanidade (centros históricos de Ouro Preto e Diamantina, o Santuário de Bom Jesus do Matosinhos, em Congonhas, e o Conjunto Moderno da Pampulha, em BH); Minas possui o terceiro maior complexo de lagoas do Brasil, no Parque Estadual do Rio Doce; Minas tem o teatro em atividade mais antigo da América — Teatro Municipal de Ouro Preto, inaugurado em 1770 —, e o maior museu de arte contemporânea a céu aberto do mundo, Instituto Inhotim, em Brumadinho.
O sotaque mineiro, o mineirês, foi eleito o mais sexy do Brasil por aplicativo de relacionamento (Happn). A comida mineira foi eleita a melhor do país, e a trigésima melhor do mundo, pelo site americano Taste Atlas — o mesmo site elegeu o queijo artesanal Canastra como o melhor do mundo, na frente dos tradicionais Grana Padano, Gorgonzola Piccante e Pecorino Sardo.
São tantos títulos, elogios, honrarias, que eu fico impactado com a mansidão local. Aqui deveria ser a terra de megalomaníacos incuráveis, de exibidos planetários, de narcisistas implacáveis, mas aconteceu o contrário: são pessoas que escolheram a discrição como sua fonte de autenticidade.
Talvez este seja o segredo: não aparecer para ser cada vez mais.
Fabrício Carpinejar
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