A agência de classificação de risco Fitch cortou nesta quinta-feira a nota de crédito do Brasil, ainda mantendo o selo internacional de bom pagador, mas alertando que o país pode em breve perder essa chancela diante do cenário econômico e político conturbado.
A Fitch rebaixou o país de "BBB" para "BBB-", último degrau que garante o chamado grau de investimento. A agência manteve a perspectiva negativa no novo rating, como era esperado pelos agentes econômicos, sugerindo que outro corte é possível ao longo do próximo ano.
A agência listou a recessão mais profunda e a fraca situação do mercado de trabalho, reduzida popularidade da presidente Dilma Rousseff, tensões entre o governo e o Congresso Nacional, o alcance das investigações na Petrobras e riscos de impeachment presidencial como fatores que podem afetar a capacidade de melhorar as perspectivas fiscais e de crescimento do país.
"O difícil ambiente político está afetando o progresso da agenda legislativa do governo e criando reações negativas para a economia", informou a Fitch em nota assinada pela analista Shelly Shetty.
Já a perspectiva negativa, ainda segundo a Fitch, reflete a visão de que o mau desempenho econômico e fiscal deve persistir, enquanto a incerteza política deve continuar pesando sobre a confiança, atrasar a recuperação do investimento e do crescimento e aumentar os riscos para a consolidação fiscal a médio prazo necessária para a estabilização da dívida pública.
O país vive cenário de recessão econômica com inflação elevada, em meio à intensa crise política entre o Executivo e o Legislativo, que inclui dificuldades de votações no Congresso Nacional de medidas fiscais preparadas pelo governo.
O rebaixamento do país pela Fitch vem após a agência Standard & Poor's retirar o selo de bom pagador do Brasil em setembro, 10 dias após o governo prever inédito déficit primário na proposta orçamentária de 2016.
Em agosto, a Moody's rebaixou o rating do Brasil para "Baa3", última nota dentro da faixa considerada como grau de investimento, e ajustou a perspectiva da nota para "estável" ante "negativa".
Ou seja, o Brasil ainda possui o selo de bom pagador por duas das mais importantes agências de risco, algo tido por muitos investidores como condição para continuarem aplicando seus recursos no país
"A Fitch está nos dando algum tempo para que avancemos na direção dos ajustes necessários para o próximo ano... Se esse avanço não vier, podemos perder o grau de investimento no primeiro trimestre (de 2016)", afirmou o economista-chefe do banco Safra e ex-secretário do Tesouro Nacional, Carlos Kawall.
No mês passado o diretor-geral da Fitch, Rafael Guedes, havia destacado que "historicamente" a agência não corta rating em dois degraus de uma vez só, mas que pode tomar decisões em intervalos mais curtos que outras.
Na nota desta quinta-feira, a Fitch alertou que a performance econômica brasileira tem divergido de forma relevante da de outros países com a mesma classificação.
Uma fonte do governo avaliou, sob condição de anonimato, que a decisão não foi surpresa, mas que é fonte de preocupação. "O governo continua trabalhando para reequilibrar as contas fiscais e diminuir a incerteza política. Também esperamos que a decisão coloque mais pressão sobre o Congresso para aprovar o pacote fiscal", afirmou a fonte.
Falando a jornalistas, no entanto, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afirmou que o governo é o principal agente para melhorar o cenário e evitar mais rebaixamentos, e o que causa instabilidade política é o governo não ter base de apoio.
PROJEÇÕES
Buscando reequilibrar as contas, o governo anunciou corte drástico nas metas fiscais para este ano e os próximos, apresentando em seguida proposta orçamentária inédita com previsão de déficit primário no ano que vem.
A deterioração das contas, para a Fitch, é inevitável, projetando que a dívida do governo ficará perto de 70 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) até 2016 e continuará a subir em 2017.
Os mercados financeiros tiveram reação relativamente contida ao rebaixamento da Fitch nesta quinta-feira, uma vez que boa parte dos investidores já esperava a decisão.
"Algumas pessoas esperavam rebaixamento de dois degraus, embora eu acreditasse que isso não fosse realista... Mas a perspectiva negativa deve ser suficiente para deixar o mercado mais sensível nos próximos dias", afirmou o economista da 4Cast Pedro Tuesta.
(Por Walter Brandimarte e Camila Moreira; Reportagem adicional de Flavia Bohone e Bruno Federowski, em São Paulo, e Alonso Soto, em Brasília)
Reuters
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