Na manhã de terça-feira, 5 de agosto de 2025, um ato de discriminação e racismo reverberou no coração de Brasília, quando mulheres indígenas dos povos Mẽbêngôkre-Kayapó e Paraná foram impedidas de participar de um evento promovido pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), em parceria com a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). O evento, intitulado "Desafios do Transporte Ferroviário e Competitividade do Setor Produtivo", foi descrito como gratuito e aberto ao público e tinha o objetivo de discutir os desafios logísticos e as soluções para a modernização do setor ferroviário no Brasil.
O encontro reuniria representantes do setor produtivo, especialistas em infraestrutura e autoridades públicas para debater questões como o alto custo do frete, a necessidade de investimentos na manutenção da malha ferroviária e o papel da regulação para fomentar a concorrência e atrair novos investimentos. Entre os temas, destacavam-se propostas para a atualização do marco legal e estratégias para ampliar a previsibilidade regulatória, essenciais para atrair novos investimentos e melhorar a eficiência do transporte ferroviário no país.
No entanto, ao chegarem à sede da CNA, as lideranças indígenas, que representam as Terras Indígenas Baú, Menkragnoti e Panará, foram barradas na porta. Foram lá para escutar e falar, especialmente sobre projetos ferroviários na Amazônia, como a Ferrogrão, que passará no meio da floresta. O que deveria ser um espaço de diálogo e participação ativa se transformou em um cenário de negação da voz e do direito constitucional de se expressar. Ao serem impedidas de ingressar, essas mulheres não apenas sofreram um ataque à sua liberdade de expressão, mas também à sua dignidade enquanto cidadãs brasileiras.
“Fomos ao evento com o intuito de dialogar, de reivindicar nossos direitos e exigir respeito. Queremos ser ouvidas. Queremos que nossos direitos sejam garantidos, conforme prevê a Convenção 169 da OIT e o nosso Protocolo de Consulta. A recusa em nossa participação é uma demonstração clara de racismo institucional e de exclusão. O Brasil ainda tem muito a avançar quando se trata de garantir a inclusão verdadeira e o respeito aos povos indígenas,” afirmou Doto Takak Ire, presidente do Instituto Kabu.
Esse episódio escancara as barreiras invisíveis que ainda permeiam as relações entre o Estado e os povos indígenas no Brasil. A discriminação não é apenas uma questão de espaço físico, mas um reflexo da exclusão histórica e estrutural enfrentada por essas comunidades. O evento, que visava discutir soluções para a modernização do setor ferroviário e a ampliação da competitividade do transporte no Brasil, deveria ser um local de inclusão e de representação para todos os cidadãos brasileiros, independentemente de sua origem étnica. Porém, ao negar a entrada dessas mulheres, o que se reafirma é a exclusão de suas vozes e a continuidade de uma prática de silenciamento que perdura há séculos.
A atitude de bloquear o acesso dessas mulheres a um evento público é um reflexo do preconceito enraizado nas estruturas de poder que ainda dominam a política e as relações institucionais no país. Este episódio não pode ser encarado como um simples incidente isolado, mas como um sintoma de uma problemática mais ampla que precisa ser urgentemente enfrentada.
O Brasil, em seu caminho para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva, precisa garantir que as mulheres indígenas e os povos originários tenham os mesmos direitos e oportunidades de participação. Este incidente reforça a urgência de um debate sobre a inclusão verdadeira e o reconhecimento das demandas indígenas em espaços de poder e decisão.
É hora de repensar o papel das instituições brasileiras na promoção de uma verdadeira inclusão, onde a diversidade seja celebrada e respeitada em todos os espaços, públicos ou privados. O Brasil precisa ouvir os povos indígenas, as mulheres indígenas, as lideranças e as representações legítimas. Precisamos garantir que suas vozes, sua sabedoria ancestral e suas reivindicações sejam ouvidas e respeitadas, e não silenciadas.
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