quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Vale mantém atividades em Vitória mesmo poluindo a água e o ar

Após ficar quatro dias impedida de operar no complexo portuário de Tubarão, em Vitória, no Espírito Santo, a Vale, que administra o porto, conseguiu uma liminar para continuar as atividades. Este foi o tempo máximo que uma ação da Justiça conseguiu impedir a empresa de continuar atuando na região, mesmo com 20 multas ambientais aplicadas e nenhuma paga.
A condição para voltar a operar no Porto de Tubarão foi a de que a empresa adotasse as medidas necessárias de controle da poluição na atmosfera e no mar da Grande Vitória em um prazo de 60 dias. No entanto, ela também entrou com um recurso para não adotar as medidas e seguir operando na região.
No dia 21 de janeiro a Justiça do Espírito Santo suspendeu as atividade da empresa no Porto de Tubarão. A Vale, então, recorreu a Justiça no Rio de Janeiro e conseguiu uma liminar suspendendo a decisão em primeira instância e autorizando a empresa a continuar atuando no local, desde que se adequasse ambientalmente em um prazo de 60 dias.
O Tribunal Regional Federal da 2ª Regional, no Rio, recebeu nessa terça-feira (2) os recursos da empresa, que devem ser julgados ainda esta semana. O que motivou a decisão inicial de interditar as atividades da Vale foi a emissão de poeira de carvão na atmosfera e o alto índice de minério no mar, o chamado pó preto.
Para conseguir a interrupção das atividades da mineradora foi preciso a união da Polícia Federal, responsável pelo cumprimento do mandado judicial de interdição, a Justiça Federal do Espírito Santo, que determinou o mandado e ainda as associações de moradores dos bairros e praias que fizeram pressão na Justiça e sofrem diretamente com a poluição causada pelas atividades da empresa.
Uma delas é a Associação dos Amigos da Praia de Camburi. Segundo o representante da associação, Paulo Pedrosa, "A nossa luta contra a empresa existe há muito anos. Por um lado ficamos felizes de termos ajudado a conseguir essa interdição, mesmo que breve, porque foi a primeira vez que conseguimos parar a Vale em 40 anos, exceto por uma vez na década de 90, que durou menos de 48 horas", explica.
Pó
Foto postada por uma moradora na página da Praia de Camburi  

"O valor econômico sempre falou muito mais alto que a humanidade. Por isso até hoje ninguém nunca conseguiu parar essa empresa. Esse pó preto nunca foi novidade pra gente, tudo o que foi mostrado agora para essa interdição é o que apresentamos durante anos. Estamos sofrendo não só por causa da poluição do ar, mas também da praia. E esse pó continua aqui caindo nas nossas casas, deixando pessoas doentes. São quatro décadas nessa situação", disse Pedrosa.
Caso a empresa não cumpra os requisitos, ela poderá interromper mais uma vez as atividades ao fim dos 60 dias, quando a Polícia Federal poderá agir novamente. No entanto, dependendo do julgamento do recurso impetrado pela empresa, é possível que nada disso aconteça e ela continue atuando normalmente no Porto de Tubarão.
"O juiz liberou de a empresa corrigir essas questões ambientais em 60 dias, mas você acha mesmo que ela vai conseguir corrigir em 60 dias o que não fez em 40 anos?", questiona o representante da associação de moradores.
Procurado pela reportagem, o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Espírito Santo, que também aplicou várias multas a empresa nos últimos anos, preferiu não se manifestar. 
Já a Vale, por meio de nota, informou que "a operação de uma estrutura do porte do Complexo de Tubarão demanda diversas especificidades técnicas, e pequenos detalhes podem gerar grandes consequências para a funcionalidade do sistema. A Companhia tem expectativa que uma nova decisão, no âmbito do recurso interposto, onde diversas informações e particularidades técnicas foram esclarecidas, elucidará todas as medidas devidas".
A empresa também disse no comunicado que "mantém e aprimora permanentemente seus programas de controle e gestão ambiental baseados nos princípios de cautela e eficiência, com grandes resultados na redução dos impactos de suas operações". 
Entenda
No dia 21 de janeiro, a prefeitura de Vitória aplicou cinco multas para a Vale e a Acellor Mittal, totalizando R$ 34,2 milhões para cada empresa, devido a emissão do pó preto. Esse valor só foi possível depois do decreto 16.590 feito no dia 18 de janeiro, que prevê as multas para empresas poluidoras e causadoras de danos ambientais em Vitória cheguem a até R$ 50 milhões. Antes disso o valor das multas poderia chegar somente a R$ 77 mil.
"Agora, fica muito mais caro poluir do que resolver o problema. Nossa equipe da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semmam) foi a campo e, a partir das amostras, fez essa quantificação", informou o prefeito de Vitória, Luciano Rezende, na ocasião.
As multas que totalizam R$ 34.236.715,96 são referentes a:
- R$ 272.653,52 por deixar de cumprir parcial ou totalmente as deliberações do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Condema) - emissão visível de poeira, névoas e gases;
- R$ 272.653,52 por operar atividade de elevado potencial poluidor ou degradador em desacordo com a legislação e normas vigentes;
- R$ 1.050.209,66 por agravamento por continuidade de infração;
- R$ 2.061.144,58 por contribuir para que o ar atinja níveis ou categoria de qualidade inferir aos fixados em lei;
- R$ 30.580.054,68 por provocar continuamente a degradação ou poluição de elevado impacto ambiental que apresente risco para a saúde pública e o meio ambiente.
Já em 2001, ainda segundo a prefeitura de Vitória, foram 13 autos de infração aplicados a Vale, também pelo descumprimento de normas ambientais. Na época, a legislação previa multa de R$ 29.452,24 para as situações constatadas no Porto de Tubarão, e que também não foram pagas. Muitas delas ainda estão em recurso. Elas são referentes a:
-  o lançamento de efluentes nas lagoas naturais do complexo;
- emissões atmosféricas nas áreas sem pavimentação e com solo exposto;
- intensa emissão de material particulado oriundo de pilhas de minério dos pátios G e H;

- vasão visível na descarga de gases da chaminé que atende a saída do forno e peneiramento da usina I;
- a não apresentação de resultados de monitoramento semestral da qualidade das águas subterrâneas  subjacentes ao aterro industrial das usinas de pelotização;
- remoção de parte dos equipamentos de controle com comprometimento da eficiência do sistema destinados ao sistema de exaustão da moega de grãos (desembarque de vagões) violando condicionantes da licença operacional;
- o não cumprimento de prazos referentes a condicionantes que tratam dos efluentes líquidos lançados no mar de Praia Mole fora dos padrões oriundos das usinas de pelotização.

O Tempo

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