Um grupo de estudantes de criatividade digital criou um mapa virtual para denunciar os locais de Buenos Aires onde as mulheres são vítimas de assédio sexual.
O mapa, intitulado 'Hablame bien' ('Fale direito', em tradução livre), registrou 700 denúncias nos dez dias desde que foi criado, disseram a argentina Carolina Vázquez, de 22 anos, e o panamenho Roberto Vásquez, de 29 anos, em entrevista à BBC Brasil por telefone.
A ideia surgiu depois que os dois e outras quatro estudantes receberam dos professores o desafio de criar um projeto que "estivesse em sintonia com os debates atuais no país".
No início deste mês, uma multidão estimada em 150 mil pessoas realizou uma manifestação em frente ao Congresso Nacional contra o feminicídio. A marcha #NiUnaMenos (Nenhuma a menos) reuniu vítimas da violência masculina e familiares, além de defensores da causa.
"Estamos recebendo mensagens realmente preocupantes e que nos levam a pensar que a agressividade das palavras pode ser um início de algo pior", diz Roberto, que se mudou há três meses para a capital argentina para realizar o curso, que termina em dezembro.
Carolina conta que recentemente caminhava perto de casa quando passou por uma obra e foi alvo de assobios.
"Como não olhei para trás e continuei andando, me jogaram cimento do alto da construção. Eu não pude ver quem era, mas procurei o arquiteto da obra e contei o que aconteceu", diz.
Segundo ela, o arquiteto afirmou que demitiria os envolvidos. "Não cheguei a ver o rosto da pessoa. Me senti agredida", afirma.
"Os homens acham que tem liberdade de dizer o que querem. Acho isso um absurdo", critica.
Os estudantes afirmam que o objetivo do mapa virtual é "alertar" sobre o problema das cantadas agressivas e do assédio sexual.
Os estudantes afirmam que o objetivo do mapa virtual é "alertar" sobre o problema das cantadas agressivas e do assédio sexual.
Eles recebem as denúncias das vítimas por meio de mensagens que são selecionadas e publicadas no Twitter e no site Hablame Bien. Em seguida, marcam no mapa o local aproximado dos incidentes.
O projeto se assemelha ao brasileiro "Chega de Fiu Fiu", do site Think Olga, que também mapeia cantadas e violência contra mulheres em locais públicos.
"Algumas denúncias chegam a ser absurdas. Uma mulher contou que foi perseguida por um carro da polícia [com policiais que a cantavam]. Outras disseram que não se sentem à vontade com certas roupas porque levam cantadas, como se não pudessem escolher o que podem usar", afirmou Carolina.
No Twitter, o grupo alerta as seguidoras para que "tenham cuidado" em certos locais, citando mensagens enviadas pelas vítimas da agressão verbal.
"Se você vai caminhando pelas ruas Guemes e Beriso, cuidado porque alguém pode gritar: "Las agarro y las mato" [‘Agarro vocês e mato’]", diz o tuíte.
Em outro post, os estudantes reproduzem o que ouviram de uma usuária: "Mamita donde vás tan apurada, vení para cá" [Mãezinha, aonde você vai com tanta pressa, vem aqui"].
Diego Rubio, diretor do curso digital da escola Underground Argentina, onde o grupo estuda, diz que a proposta era que os alunos "usassem as ferramentas disponíveis para construir algo que fosse além da sala de aula".
Os estudantes participaram de programas de televisão e foram notícia nos principais jornais e sites de notícias da Argentina.
"Jamais imaginaríamos essa repercussão toda", afirma Rubio.
O professor diz que ele e os alunos, ao desenvolverem o projeto, concluíram que a agressividade verbal nas ruas não é um fato isolado.
"O principal objetivo do mapa virtual é que as pessoas visualizem essa realidade. Que fique claro que alguns ‘piropos’ [cantadas] que vemos agora no site Hablame Bien dão até medo", diz o professor.
Segundo a imprensa local, existem três projetos de lei na Argentina que preveem multas de até mil pesos (R$ 340) para os autores de cantadas agressivas ou assédio sexual.
BBC Brasil
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