quinta-feira, 26 de maio de 2016

Transtornos psíquicos afastam 13% da comunidade da UFMG

Assistir aos noticiários era o maior prazer de Osvaldo* na adolescência, quando ainda morava em São Francisco, no Norte de Minas. O sonho de cursar comunicação social foi alcançado em 2011, aos 25 anos, quando ingressou na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na capital. Mas, em um mês de estudo, a satisfação deu lugar a uma profunda tristeza. “Em minha primeira semana já me senti deslocado. Acabei trancando a matrícula”, contou o jornalista, 30.

Osvaldo entrou para os 13% da comunidade acadêmica, entre alunos e servidores, que se afastaram da instituição por transtornos mentais. O dado é de estudo do Departamento de Atenção à Saúde do Trabalhador (Dast) da UFMG, entre 2011 e 2015 – casos envolvendo aposentados e terceirizados não entraram no levantamento.

A pesquisa foi feita a pedido da Comissão de Saúde Mental da UFMG (Cisme). Diante do percentual considerado alto pela universidade, a UFMG irá criar diretrizes para combater a evasão por conta do sofrimento mental. Conforme o estudo, 1.781 servidores receberam diagnóstico de transtorno psicológicos no período, quando foram feitos 2.357 afastamentos por problemas psíquicos – um funcionário pode ter sido licenciado mais de uma vez, e o total de servidores afastados não foi informado. No caso dos alunos, foram 440 diagnosticados – a instituição não informou o número de licenças nem de alunos afastados. No caso de Osvaldo, ele retornou à universidade em 2012, após tratamento. Ele hoje exerce a profissão.

“O número de doentes relatado é apenas uma parcela da população da UFMG, a que recebeu atendimento. A pessoa nesse quadro paga um preço muito alto. Esse sofrimento precisa de uma atenção especial, sobretudo da universidade”, avaliou a diretora do Dast, Regina Barbosa.

Motivos. Os problemas mais comumente encontrados foram depressão, síndrome do pânico, ansiedade e distúrbios do humor.

Os motivos principais no caso dos alunos são, segundo Regina, a inadaptação ao ambiente, a competitividade e a distância da família. Para os servidores, o problema pode estar ligado aos processos de trabalho, qualificação acima do exigido pelo cargo, entre outros.

“O ambiente da faculdade é extremamente adoecedor, ele gera exclusão e estresse”, lamentou Laura Camey, representante do coletivo Loucura Livre da UFMG, que atua na luta antimanicomial e no acolhimento dos estudantes com sofrimento mental.

* nome fictício
Admitir problema é o 1° passo
Admitir que existe um problema é o primeiro passo para a recuperação de um paciente com distúrbios psíquicos. “Quando o mal-estar impede que a pessoa se relacione, seja no trabalho ou na vida social, está na hora de procurar ajuda. É importante investir em algo que ela goste”, afirma Aline Mendes, psicanalista e professora da PUC Minas.

A especialista destaca ainda que o tratamento vai além do diagnóstico do problema. “É preciso compreender aquele sujeito, buscar o que o faz sofrer e o que provoca o mal-estar, para buscar uma recuperação”, completa. (DC)

Estresse
Unidades. O Hospital das Clínicas da UFMG foi o local com o maior número de atendimentos de servidores por unidade. Foram 2.283 perícias em 725 funcionários. Entre as razões, estaria o fato de as atividades hospitalares aumentarem o desgaste físico e o estresse.

Detalhes
Fim de semestre. Os atendimentos a alunos são mais frequentes em outubro, novembro e dezembro. As razões seriam os trabalhos e as provas, além de dificuldades nas disciplinas. No caso dos servidores, as perícias foram constantes ao longo de todo o ano.
OMS. Segundo a Organização Mundial da Saúde, entre 10% e 13% da população mundial – 700 milhões de pessoas – têm transtornos mentais.

Novas áreas de convivência são sugestão
A UFMG discutiu diretrizes para reduzir os afastamentos por conta de transtornos mentais durante a IV Semana de Saúde Mental, que terminou no dia 20. Entre as propostas estão a aproximação dos serviços de atendimento a estudantes e funcionários, como ouvidoria e psicologia. A melhoria do espaço físico, com a implantação de áreas de convivência, e uma aproximação com o sistema público de saúde também foram sugeridas.

“Todos estão vulneráveis. Melhorar a integração com esses dispositivos pode reduzir esses casos”, avaliou o professor de psiquiatria da Faculdade de Medicina da UFMG e membro da Comissão de Saúde Mental da instituição (CISME) Maurício Daker.
O Tempo

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