segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Cobrança de dívida não pode constranger o inadimplente

Segundo dados da consultoria Serasa Experian, o país fechou 2017 com nada menos do que 60,4 milhões de consumidores inadimplentes, o que representa aumento de 1,34% ante o ano anterior, quando 59,6 milhões de brasileiros estavam nessa condição. Diante desse quadro, não são raras as vezes em que pessoas são cobradas de forma indevida ou constrangedora, no telefone fixo de seu local de trabalho, nos finais de semana ou feriados, por exemplo, desrespeitando o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Outra prática comum, e não menos ilegal, ocorre quando a pessoa que está fazendo a cobrança deixa recado, com parentes, colegas de trabalho ou vizinhos, passando a eles alguma informação sobre o débito.

“Cobrar uma dívida não é ilegal. O que não pode é o consumidor ser exposto ao ridículo ou ser ameaçado. A dignidade da pessoa tem que ser preservada. Informações não podem ser passadas a terceiros”, explica a advogada da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste), Lívia Coelho. Nesse sentido, ela cita os artigos 42 e 71 do CDC, que tratam do tema e protegem o devedor dos abusos cometidos por empresas de recuperação de crédito ou pelos próprios credores.

Segundo ela, o primeiro deles determina que “na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça”. Já o segundo proíbe “utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou moral, afirmações falsas, incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira em seu trabalho, descanso ou lazer”, prevendo, em caso de descumprimento, pena de detenção de três meses a um ano e multa.

Em caso de abusos, a advogada orienta o inadimplente a procurar os órgãos de defesa do consumidor para fazer uma reclamação formal. “Porém, é importante que a pessoa consiga provar o ocorrido. E isso pode ser feito por meio de gravação da conversa telefônica, com horário, ou da apresentação de mensagens recebidas via e-mail, SMS ou WhatsApp, por exemplo. Outra alternativa é deixar a ligação registrada no celular”, diz ela.

Lívia lembra que as operadoras de telefonia fixa e móvel mantêm o registro de todas as ligações recebidas por determinado número de telefone, e ele pode ser solicitado pelo usuário. “Mesmo assim, o consumidor tem a seu favor a inversão do ônus da prova. A outra parte é que tem que provar que não fez a ligação”, diz ela. Caso a reclamação não surta efeito, o consumidor pode acionar a Justiça e pleitear indenização por danos morais, que, em muitos casos, é concedida.

Procurada, a Associação Nacional das Empresas de Recuperação de Crédito (Aserc) preferiu não se pronunciar sobre o assunto.

Comerciante de Minas Gerais recebe indenização de R$ 10 mil


De maneira geral, a tendência dos tribunais, desde que comprovados os abusos por parte do credor, é de conceder indenização por danos morais ao consumidor que teve seus direitos violados.

Em Minas Gerais, por exemplo, uma lojista foi indenizada, em 2017, em R$ 10 mil, por ter sido abordada de maneira constrangedora por funcionários de um grande banco, que cobravam dela o pagamento de uma dívida.

De acordo com o processo, a autora da ação abriu uma conta–corrente na instituição financeira, e, em janeiro de 2015, a conta ficou com saldo negativo de R$ 5.000, devido ao uso do cheque especial.

Pouco tempo depois, a lojista, segundo os autos, afirmou que foi surpreendida em seu estabelecimento por duas funcionárias do banco, que ofereceram financiamento para que ela quitasse seu débito. Como havia clientes no local, o fato lhe causou constrangimento e humilhação, fazendo com que ela entrasse com ação requerendo indenização por danos morais.

Ainda conforme os autos, testemunhas afirmaram que uma funcionária do banco, ao cobrar da lojista e expor a dívida, usou tom de voz elevado. Além disso, a loja estava cheia e alguns clientes ficaram constrangidos com a situação. Em sua defesa, a instituição financeira disse que a autora não apresentou, nos autos, documentação que comprovasse o dano. O banco também alegou que o ocorrido não passou de um mero aborrecimento.

Porém, em sua decisão, o desembargador Pedro Bernardes, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), sustentou que “mesmo com o atraso no pagamento, não se justifica a cobrança abusiva pelo apelante (…) que dispõe de diversas medidas legais para o recebimento do seu crédito, sem infringir a integridade moral da devedora”.

Carro. Em outro caso, uma mulher foi indenizada em R$ 8.000 após sofrer constrangimento por cobranças excessivas por parte do homem com quem negociou a compra de um carro.

O Tempo

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