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Número de registro supera em 16,5% as ocorrências de 2015
PUBLICADO EM 19/02/17 - 03h00
BRASÍLIA. Tachada de mal do século, a depressão é responsável por retirar do mercado de trabalho milhares de profissionais todos os anos. No ano passado, 75,3 mil trabalhadores foram afastados em razão do mal, com direito a recebimento de auxílio-doença em casos episódicos ou recorrentes. Eles representaram 37,8% de todas as licenças em 2016 motivadas por transtornos mentais e comportamentais, que incluem não só a depressão, como estresse, ansiedade, transtornos bipolares, esquizofrenia e transtornos mentais relacionados ao consumo de álcool e cocaína.
No ano passado, mais de 199 mil pessoas se ausentaram do mercado e receberam benefícios relacionados a essas enfermidades, o que supera em 16,5% o total registrado em 2015, de 170,8 mil. Entre 2009 e 2015 (únicos dados disponíveis), quase 97 mil pessoas foram aposentadas por invalidez em razão de transtornos mentais e comportamentais, com destaque para depressão, distúrbios de ansiedade e estresse pós-traumático. Ao todo, esses novos benefícios representam, hoje, uma conta de R$ 113,3 milhões anuais aos cofres públicos.
Para os especialistas, a situação evidencia a necessidade de colocar esse tipo de transtorno no topo da lista de preocupações para políticas públicas e de empresas. A própria Organização Mundial de Saúde (OMS) alerta que, até 2020, a depressão será a doença mais incapacitante do mundo. A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) estima que entre 20% e 25% da população tiveram, têm ou terão um quadro de depressão em algum momento da vida.
Para Leonardo Rolim, especialista em Previdência, as políticas públicas falham, pois não se preocupam em reintegrar os profissionais no ambiente de trabalho. Segundo ele, apenas 5% dos trabalhadores afastados são reabilitados no emprego. “Os números são muito grandes, e há uma falha na reabilitação. Mesmo quando volta, o trabalhador demora muito. O Estado gastaria menos reintegrando esse trabalhador do que pagando benefícios por muitos anos”, disse.
Ao longo dos seus 32 anos, Manoela Serra já conviveu com episódios depressivos várias vezes. Ela foi diagnosticada com transtorno bipolar em 2009, aos 25 anos. Isso faz com que tenha de conviver com ciclos de euforia e outros em que mergulha em depressão profunda. O primeiro episódio depressivo ocorreu quando ela tinha 15 anos.
No mercado de trabalho, pulou de emprego em emprego, sem se firmar em razão das consequências do transtorno. Quando a depressão começava, ela era obrigada a levar atestados para se manter afastada. Embora avalie que foi compreendida pelos patrões, quando os atestados se tornavam mais frequentes, não restava outra opção a não ser recorrer ao INSS ou pedir demissão. Nesse ciclo, ela se demitiu de empregos de garçonete, caixa, vendedora, atendente de casa de câmbio e companhia aérea. Diante da falta de uma estrutura de apoio, a alta rotatividade do profissional no mercado de trabalho é um dos efeitos da doença.
Segundo Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, a capacidade de trabalho e todas as outras funções do corpo ficam abaixo do normal em uma pessoa deprimida.
SAIBA MAIS
Crise piorou cenário
Segundo a Associação Nacional de Medicina do Trabalho, a crise e, consequentemente, o desemprego afastaram mais trabalhadores por depressão. Em 2014, foram 83,2 mil. Em 2015, caiu para 63,8 mil. Como agravamento da crise, em 2016, voltou a subir para 75,3 mil.
Segundo a Associação Nacional de Medicina do Trabalho, a crise e, consequentemente, o desemprego afastaram mais trabalhadores por depressão. Em 2014, foram 83,2 mil. Em 2015, caiu para 63,8 mil. Como agravamento da crise, em 2016, voltou a subir para 75,3 mil.
Investimento público
O Ministério da Saúde esclareceu que tem uma política nacional de saúde mental que é referência internacional e que gastou R$ 1,3 bilhão em 2015.
O Ministério da Saúde esclareceu que tem uma política nacional de saúde mental que é referência internacional e que gastou R$ 1,3 bilhão em 2015.
Carga exaustiva e atividade estressante agravam problema
RIO DE JANEIRO. Uma das diretoras da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT), Rosylane Rocha explica que a depressão é uma doença, com um componente genético, que pode ser desencadeada por uma série de fatores, como o contexto social ou um determinado evento de vida da pessoa. Uma vez que exista a predisposição para a doença, uma carga exaustiva e recorrente de trabalho, um ambiente muito estressante ou uma situação de estresse pós traumático, por exemplo, podem fazer com que o trabalho seja o fator responsável por desencadear o problema. É nesses casos em que os benefícios são considerados acidente de trabalho.
Para o presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, o trabalho pode, de fato, ter impacto sobre a saúde do trabalhador. “O termo ‘estresse’ vem da física, para você medir o estresse de uma ponte, por exemplo. Se passar mais peso do que o previsto, a ponte estressa e rompe. Com o ser humano é a mesma coisa. Se ele passa a trabalhar 12 h por dia, por exemplo, vai se estressar e romper, quebrar”.
ESPECIALISTAS
“A crise vai aumentar isso. Contas penduradas, medo de desemprego, isso afeta o equilíbrio emocional.” Rosylane Rocha, diretora da Associação Nacional de Medicina do Trabalho
“Depressão tem tratamento, o que pode permitir um retorno saudável ao emprego.” Antônio Geraldo da Silva, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP)
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