segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Crime: consumo de álcool ou outras drogas?

Amadeu Garrido de Paula

Ao contrário da primeira impressão, esses alucinógenos não podem ser postos no mesmo balaio.

À sociedade, importam as consequências de um ato, para ser tipificado como crime, ainda que de mero perigo. Se não há possibilidade de ser violado um bem jurídico tutelado pelo Estado, é possível cogitar-se de tudo, menos de crime.

O álcool, livre e correntio, é verdadeiro antípoda dos demais alucinógenos. O álcool se inicia, no plano dos efeitos, com a soltura do consumidor por meio da comunicação. Fica mais falaz. Em seguida, feliz. Depois, alguns, reflexivos. E o último estágio pode desencadear a conduta de violência, que resulta em discussões, injúrias, ameaças e, ao término, lesões corporais e homicídios. Temo estatísticas estarrecedoras dos crimes originários do consumo do álcool em nosso País, sobretudo nos finais de semana.

O álcool envolve os demais atores sociais porque extroverte. É raríssimo o bebedor solitário, porquanto bebe-se para melhor integrar-se numa sociedade comunicativa, dinâmica e, em seus núcleos duros, irracional, iníqua etc.

Já as drogas introvertem. O drogado não busca o sentido do mundo, mas seu próprio sentido no mundo. Volta-se para suas profundezas. Introjecta-se. Medita, a seu modo, estimulado a ver pedras que voltam a ser líquido antes de cristalizado, imensos oceanos, luzes incompreensíveis. Estatísticas idôneas demonstram que o usuário de alucinógenos volta-se para seu insulamento, ao contrário do álcool, cuja integração social é sua razão de ser. Daí a possibilidade de o álcool ferir um bem jurídico pessoal e da coletividade, o que não ocorre com a desidratação íntima do drogado.

É claro que não podemos apoiar essa desintegração pessoal. Mas, aqui, estamos a falar de crimes, atos predadores de um bem juridicamente tutelado pelo Estado. Se o álcool, potencialmente, pode gerar homicídios, que, infelizmente, como já mencionado, ocorrem às dezenas nas semanas cruéis de nosso País, a droga fica limitada à interinidade do próprio consumidor. Em suma, combater o álcool seria, preventivamente, prevenir um crime; combater as drogas é combater uma heresia.

Note-se que falamos apenas de um e de outro estupefaciente. Não do tráfego, que envolve questões de cunho mais sociológico e penal. No âmbito da criminologia, não há dúvida de que o álcool - lícito, por conta de interesses legitimados por nosso direito  - não se considera um desvalor jurídico, como tal consideradas as drogas pela grande maioria "limpa", em que pesem as cervejas, o vinho e a cachaça.


Amadeu Garrido de Paulaé Advogado, sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados.

Esse texto está livre para publicação.

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