Amadeu Roberto Garrido de Paula
A liberdade política fundada no humanismo e no culturalismo sofre ataques mortais que não podem ser minimizados. A vitória de Trump nos Estados Unidos tem o sentido de ferir valores humanos fundamentais. O xadrez do mal de Putin, imperial e opressivo, à sorrelfa, domina terras orientais e robustece a extrema direita nos países ocidentais.
Os extremos - esquerda e direita - crescem num momento de crise. É natural. O sistema fundado no binômio democracia constitucional das liberdades e economia de mercado ficou seriamente combalido na crise de 2008. Muitos cogitaram de novas fórmulas de governo e de organização social. Sonharam. O capitalismo não é infalível e sofre de crises periódicas. A última ainda manifesta consequências. Não se recompôs, suas economias líderes e as dos países emergentes convivem hoje com insuportáveis taxas de desemprego, indicadoras de seus males. No entanto, não há alternativa. A economia socialista, que Karl Marx previu como sucedâneo dessas crises capitalistas, segundo ele determinadas pelo mal da livre concorrência, morreu. Não-à-toa o marxismo foi um idealismo às avessas, como pronunciava seu fundador.
Também já se disse que os extremistas, de direita e esquerda, em certos momentos, se unem. Claro. Para afastar o núcleo da razão e da estabilidade e se confrontarem. E, daí, submeterem o mundo inteiro a uma catástrofe. As propostas centristas, que apelam à racionalidade política, são seus maiores inimigos. Nada pior para os extremismos do que os regimes constitucionalizados, ordenados, de igualdade de oportunidades, de flexibilidade entre as classes sociais, de meritocracia como fundamento da ascensão humana, de respeito aos direitos humanos fundamentais. Caem as bandeiras. É o patriotismo dos incendirários contra o futuro de paz no mundo dos globalistas.
Depois do equívoco do referendo que gerou o brexit e da eleição de Ronald Trump, o pior para o orbe, inclusive para o Brasil, seria a eleição de Marine Le Pen na França. Em parceria com Donald Trump e, nas trevas, com o ex-agente da KGB Vladimir Putin, progressivamente caminhariam para, finalmente, implantar o nazi-fascismo. O mundo sem pobres e excluídos, que precisam de proteção do Estado, desperdício do dinheiro de quem o tem. A solução é sua exclusão física, na cabeça desses proprietários do planeta.
As propostas básicas dessa gente são ressuscitar o conceito de soberania nacional, que gerou os conflitos bélicos da história, tendo como pano de fundo a conquista de mercados, que hoje assume a forma protecionista e cambial. Morram os refugiados de conflitos em Estados menores que eles mesmos incitam. A justificativa é dos tempos atuais: não teremos holocaustos e campos de concentração. Simplesmente defendemos nossos nacionais e não amparamos quem não tinha nenhum crédito contra nossos Estados, dirão sem nenhum drama de consciência.
O propósito envolve crueldade tamanha que é repudiado, principalmente, por uma mulher vinda de um partido de direita (civilizada), Ângela Merkel. O fechamento da União Europeia levaria progressivamente à falência do mundo europeu, onde têm abrigo os rebotalhos humanos vindos dos países fustigados pelas guerras. A volta ao nacionalismo dos séculos passados determinaria o fim dos refugiados, o esfarelamento das teses de direitos humanos e novos conflitos entre nações, até que restassem apenas russos, americanos, franceses e seus dominados num mundo higienizado.
Essa alucinação, em parte, foi superada pela vitória de Edmmond Macron. Homens de pensamento na França perceberam a necessidade do voto útil, para salvação do mundo. Jovem, bem formado, filósofo, Macron está coberto de razão ao falar em centralismo radical. Cabe-lhe uma incessante política de convencimento de seus eleitores. Assim como devemos falar em democracia e constitucionalismo radical. O grande mal dessa posição equilibrada consistiu, nos momentos anteriores, em não ir às raízes, o que diziam, as correntes radicais, abordar. Jovens, principalmente, preferem soluções imediatas e fundas , que consideram reais. A estabilidade do centro seria mais do mesmo. Talvez a ameaça desses extremos reflita o bem dialético, que sempre emerge das teorias ensandecidas, como se viu na segunda guerra mundial, na resistência dos aliados: a construção sólida de uma ideologia de centro, do Estado racional e da sociedade justa.
O primeiro discurso do filósofo que falou ao povo da liberdade, igualdade e fraternidade, deu-se no Louvre, não por escolha do candidato, mas por imposição da Prefeitura de Paris. As imagens dos pensadores que guarnecem seu entorno devem ter feito das suas. De uma esperança liberal e culturalista só poderiam sair a voar pelo mundo as aves que pousam entre as imagens do Louvre. Dos grupos que foram celebrar a vitória de Macron crescem os direitos do homem, ao agitar das bandeiras francesas e da UE, o som da Marselhesa e o refrão célebre: "le jour de gloire".
Amadeu Roberto Garrido de Paula, é Advogado e sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados.
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