domingo, 12 de março de 2017

Extinção de abelhas afeta cadeia alimentar

A crescente matança de milhares de colônias de abelhas em várias regiões do Brasil e do mundo, atribuída à pulverização de agrotóxicos cada vez mais potentes, acendeu o alerta de especialistas sobre uma possível crise em toda a cadeia alimentar. A bióloga e professora da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) Generosa Sousa Ribeiro estima que pelo menos 15 mil colmeias tenham sido extintas nos últimos cinco anos. A dimensão desse extermínio é catastrófica, podendo ultrapassar 1 trilhão de insetos no país. Os casos, que se multiplicam em São Paulo, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, têm levado agricultores a alugarem enxames ou optarem pela polinização manual, enquanto nos Estados Unidos cientistas da Universidade de Harvard tentam desenvolver uma abelha-robô.
Uma das perdas mais recentes foi a do apicultor Wanderley Fardin, em Porto Ferreira, no interior de São Paulo. No mês passado, ele teve um prejuízo de mais de 10 milhões de abelhas, o equivalente a R$ 200 mil, investidos durante um trabalho de 30 anos. As 136 colmeias ficam ao lado de um canavial, e, em entrevista a uma rede de TV local, ele disse acreditar que as mortes foram causadas depois que agrotóxicos foram despejados de um avião para matar os insetos que afetam a plantação de cana. Notificações como essa têm aparecido toda semana, diz Generosa.

Uma petição de origem canadense tem rodado o mundo reunindo assinaturas à favor do banimento de pesticidas em defesa das abelhas. O principal alvo é o imidacloprido, “um químico terrível que é usado em boa parte das frutas e dos vegetais”, diz o texto. Um dos apoiadores é o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau. O objetivo é reunir 4,5 milhões de assinaturas, e, até o fechamento desta matéria, cerca de 4,4 de pessoas milhões já haviam aderido à petição (acesse-a clicando AQUI).
Como medida preventiva, em 2012, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) proibiu, provisoriamente, a aplicação por aviões de agrotóxicos à base de imidacloprido. E, no mesmo ano, deu início ao processo de reavaliação de quatro agrotóxicos com efeitos nocivos às abelhas: imidacloprido, tiametoxam, clotianidina e fipronil. Em 2010, dados do Ibama mostravam que as empresas comercializaram 1.934 toneladas de imidacloprido, representando cerca de 60% do total referente aos quatro ingredientes.
Silenciosamente, aquele zum-zum-zum característico e tão importante a toda cadeia alimentar vai calando-se e a redução das abelhas pode afetar também a produção de comida. A atuação delas resulta em 1/3 da produção de alimentos e interfere em 35% das colheitas em todo o planeta.
Membro do Fórum Nacional de Combate aos Agrotóxicos e da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, o ativista ambientalista Cleber Folgado conta que, no Brasil, o tema é discutido em uma campanha nacional. “Uma das bandeiras de luta é o fim da pulverização aérea. Cerca de 70% não atinge o alvo, contaminando mananciais de água, terra, animais e, dentre eles, as abelhas”, afirma.
Segundo a assessoria de imprensa do Projeto Colmeia Viva, idealizado pelo Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Vegetal (Sindiveg), está sendo feito um levantamento de dados sobre a mortalidade de abelhas em São Paulo. Os indícios até agora (em dez casos) apontam para o uso incorreto de defensivos agrícolas. O mapeamento, em parceria com universidades, possui um canal de atendimento exclusivo para agricultores e apicultores, pelo número 0800 771 8000. “A pesquisa dará origem a um plano de ação nacional voltado às boas práticas de aplicação dos defensivos agrícolas para uma relação mais produtiva entre apicultura e agricultura”, diz a nota.
Análise. Hoje, da forma como é feita a produção agrícola no Brasil, existe uma dependência do uso de agrotóxico para produção em larga escala. A lógica de mercado do agronegócio praticamente não permite aos produtores outra forma de cultivo.
O doutorando em saúde coletiva pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Pedro Abreu é categórico ao afirmar que não existe forma segura de utilizar os agrotóxicos. Segundo ele, pesquisas já mostraram que resíduos de químicos foram encontrados no leite materno e que doenças como câncer são mais comuns no meio rural onde esses produtos são usados. Além das abelhas, os agrotóxicos têm levado a malformações em sapos e infertilidade em outros animais aquáticos.
Para o especialista, o maior desafio é abandonar o modelo de produção imposto pelo agronegócio e fomentar outras formas de consumo, como o de pequenos produtores. Um dos maiores exemplos desse modelo é Cuba: “Hoje, mais de 50% dos pequenos produtores (de lá) são totalmente agroecológicos”.
Concentração
Produção.A Anvisa realiza o monitoramento dos níveis de resíduos de diversos defensivos agrícolas. No relatório de 2009, os que apresentaram as maiores irregularidades foram: pimentão, morango, uva, cenoura, alface, tomate, mamão e laranja.


QUÍMICOS

Cerco se fecha para empresas produtoras

Além da cobrança de atitude dos governos, as empresas produtoras de defensivos agrícolas são as mais atacadas nas principais petições na internet. No ano passado, por causa disso, os Estados Unidos abriram uma consulta formal sobre pesticidas, e a União Europeia suspendeu o uso dos produtos por dois anos. Entretanto, de acordo com os documentos, as empresas estão fazendo lobby para mantê-los no mercado.
No Brasil, Bayer e Monsanto são as mais citadas. Por meio de nota, a Bayer informou que “se preocupa com a saúde das abelhas” e que a redução dos insetos não pode ser atribuída a uma única causa. “Se aplicados de acordo com as instruções da embalagem, o uso dos produtos não as prejudica”, diz o material. Por telefone, a assessoria de imprensa da Monsanto preferiu não se posicionar sobre a petição, pois disse que o único agroquímico produzido pela empresa é o herbicida glifosato. (LM)


‘ROBOBEES’

Cientistas criam inseto-robô para polinizaçãoCientistas da Universidade Harvard estão desenvolvendo, desde 2013, um bichinho voador com apenas 3 cm de comprimento e 80 mg inspirado nas abelhas para, possivelmente, ajudar na polinização das plantas, caso os animais entrem em extinção.

Os RoboBees (algo como RobôAbelhas) ainda estão em fase de protótipo e, segundo o projeto, poderiam contribuir também para o monitoramento climático e ambiental. Além de o tamanho e o peso serem praticamente os mesmos dos insetos, as asas do minirrobô batem separadamente, 120 vezes por segundo, permitindo que o voo seja manobrado e que o artefato decole na vertical e paire no ar.
Mesmo com todas essas características, para a bióloga Generosa Sousa Ribeiro, a ideia é um “absurdo”. “No caso da espécie mamangaba e do maracujá, o movimento de vibração, que só a abelha produz, faz com que o pólen seja derrubado, e possa ser transportado para fecundar a flor. Esse é um fenômeno natural que eu duvido que o robô será capaz de realizar. A polinização ficará deficiente”, diz. (LM)
O Tempo


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