Autor do livro “Por que Mentimos: Os Fundamentos Biológicos e Psicológicos da Mentira”, o especialista sustenta que somos programados para enganar desde os primórdios e que o mentiroso é também mais inteligente por dizer o que as pessoas querem ouvir.
Um dos comportamentos mais naturais do ser humano junto com a fala e os primeiros passos: a capacidade de mentir. E, quanto mais praticado, melhor é o desempenho, afirma o filósofo David Livingstone Smith em entrevista exclusiva a O TEMPO.
Todo mundo mente?
Sim, mentir é um aspecto normal da vida social humana. Todos (talvez com exceção das pessoas com deficiências mentais severas) mentem quase todos os dias, e a maioria das pessoas mente para si e se engana sobre a frequência com que mente. Se alguém te disser “eu nunca minto”, você pode ter certeza de que essa pessoa está mentindo para você.
A mentira é um recurso reconhecido como exclusivamente humano? Por que as pessoas mentem?
Depende do que você quer dizer com mentir. Se você usa uma definição restrita de mentira como algo que se diz a outra pessoa na intenção de fazê-la acreditar em algo falso, então mentir é exclusivamente humano. Mas se você entende de forma mais ampla, como qualquer comportamento que tenha a função de fazer com que os outros falsifiquem algum aspecto, então a mentira é encontrada em todos.
Pode explicar melhor?
Por exemplo: a orquídea-espelho é uma planta que produz flores que imitam a aparência e aroma de fêmeas de uma certa espécie de vespa. As vespas machos tentam acasalar-se com essas flores porque “acreditam” que são vespas femininas – e assim transportam o pólen de flor em flor. Poderíamos dizer que a planta orquídea “mente” para obter a polinização da vespa. As pessoas usam esse recurso com base em várias razões particulares, mas, em geral, mentir é uma maneira de obter o que queremos.
Qual é o papel que a enganação desempenha na evolução?
Como mencionei, muitos organismos não humanos enganam os outros, às vezes até pela forma. Por exemplo, alguns insetos se parecem com fezes de pássaros, o que os protege de serem comidos. Esses comportamentos instintivos são todos produtos da evolução. O caso humano é mais complicado. Alguns de nossos comportamentos desonestos podem ter sido estabelecidos em nossa espécie por seleção natural, mas, para a maior parte dos humanos, a melhor explicação é pela evolução da inteligência social.
A estrutura de nossa mente pode ter sido moldada por essa necessidade de enganar?
Até o momento podemos apenas especular sobre isso. Minha visão é que evoluímos como primatas altamente sociais. Para ter sucesso em grandes e complexos grupos sociais, é necessário um alto nível de inteligência social. Uma importante parte da inteligência social é o gerenciamento da maneira como os outros nos percebem, e mentir é uma das maneiras de fazermos isso. Então, não acho que somos moldados pela evolução para mentir, mas fomos moldados para ser socialmente inteligentes, e isso nos permite mentir.
Explique por que a enganação, a mentira e a falsidade estão no cerne da nossa herança cultural?
As grandes obras da literatura são em grande parte sobre mentiras e decepções, assim como filmes e programas de televisão. O livro de Gênesis na “Bíblia” está cheio de histórias sobre mentiras: Deus e a serpente mentem para Adão e Eva. É claro que a religião é uma grande mentira.
A mentira tem seu lado positivo? Qual seria?
Tem muitos aspectos positivos. A sociedade humana não poderia existir se nós não mentíssemos todos os dias. Uma pessoa que não saiba mentir bem é pouco provável que seja bem-sucedida na vida. Claro, muitas vezes não identificamos isso como mentira e chamamos esse comportamento de “diplomático”, “educado”, ou “estratégico”. Mas essas expressões evasivas são apenas uma maneira de mentir sobre mentir.
Por isso, dizemos que existem mentiras do bem (branca) ou mentiras do mal?
Sim. É incorreto dizer que mentir é sempre moralmente errado. Por exemplo, seria inocente dizer que mentir para proteger os outros (ou a si mesmo) de algum dano é imoral. As mentiras que promovem a injustiça, o dano ou o sofrimento são moralmente erradas.
Você acredita que a mentiras faz o cérebro adaptar-se à desonestidade?
Quanto mais praticamos qualquer coisa, melhor conseguimos ser. No entanto, a mentira começa cedo, durante a primeira infância. A capacidade de mentir é estabelecida até os 4 anos ou até mais cedo. E, quando nos tornamos adultos, temos uma grande bagagem de prática. Então, praticamente todos nós estamos adaptados à desonestidade.
Por isso você diz que o mentiroso é também mais inteligente, pois fala aquilo que as pessoas querem ouvir?
A habilidade em mentir é um aspecto da inteligência social, e as pessoas socialmente inteligentes são quase sempre virtuosas ao mentir. Às vezes, isso é prejudicial, e, às vezes, não. É errado pensar que a inteligência está ligada à moralidade. Algumas das pessoas mais destrutivas (por exemplo, Hitler) também foram bastante inteligentes.
Acreditar na própria mentira pode fazer mal?
Não necessariamente. Por exemplo, todos nós fingimos que o mundo não está cheio de sofrimento, que nossos entes queridos não morrerão, e assim por diante. Isso nos dá tranquilidade. Os psicólogos descobriram que a saúde mental está relacionada com níveis ideais de autoengano e que as pessoas deprimidas mentem a si mesmas com menos frequência. Mentir para nós mesmos também pode nos ajudar a mentir de forma mais eficaz. Se você acredita em suas próprias mentiras, elas serão mais convincentes para os outros.
A partir de quanto a mentira passa a ser patológica (mitomania)?
A chamada “mentira patológica” é uma espécie de mentira incompetente. A pessoa mente sem razão. Está mentindo por mentir.
Qual a diferença entre mentir e omitir?
Mentir pode ser não verbal. Nós podemos fazê-lo sem dizer nada. Então, se a omissão tem a função de fazer com que os outros formem falsas crenças, isso conta como mentira.
É possível perceber sinais da mentira?
Sim, claro. As pessoas muitas vezes estão ansiosas quando mentem. Sinais de nervosismo podem indicar que uma pessoa está mentindo. No entanto, isso nem sempre é confiável. As pessoas que são mentirosas muito habilidosas ou que acreditam em suas próprias mentiras podem não mostrar sinais de nervosismo, e as pessoas podem mostrar sinais de nervosismo mesmo quando não estão mentindo. Não existe um método mágico.
Por que você diz que os políticos são mentirosos profissionais?
Os políticos são vendedores, e o que eles vendem são, muitas vezes, ilusões. Eles são mestres de manipular nossos medos, esperanças e apresentar imagens falsas ou enganosas de si mesmos, do estado do mundo e do que eles farão. É simplesmente impossível ser um político de sucesso sem ser um mentiroso habilidoso. Além disso, esperamos que os políticos digam o que queremos ouvir. Nós exigimos ilusões e esperamos que os políticos as entreguem.
Todo mundo mente?
Sim, mentir é um aspecto normal da vida social humana. Todos (talvez com exceção das pessoas com deficiências mentais severas) mentem quase todos os dias, e a maioria das pessoas mente para si e se engana sobre a frequência com que mente. Se alguém te disser “eu nunca minto”, você pode ter certeza de que essa pessoa está mentindo para você.
A mentira é um recurso reconhecido como exclusivamente humano? Por que as pessoas mentem?
Depende do que você quer dizer com mentir. Se você usa uma definição restrita de mentira como algo que se diz a outra pessoa na intenção de fazê-la acreditar em algo falso, então mentir é exclusivamente humano. Mas se você entende de forma mais ampla, como qualquer comportamento que tenha a função de fazer com que os outros falsifiquem algum aspecto, então a mentira é encontrada em todos.
Pode explicar melhor?
Por exemplo: a orquídea-espelho é uma planta que produz flores que imitam a aparência e aroma de fêmeas de uma certa espécie de vespa. As vespas machos tentam acasalar-se com essas flores porque “acreditam” que são vespas femininas – e assim transportam o pólen de flor em flor. Poderíamos dizer que a planta orquídea “mente” para obter a polinização da vespa. As pessoas usam esse recurso com base em várias razões particulares, mas, em geral, mentir é uma maneira de obter o que queremos.
Qual é o papel que a enganação desempenha na evolução?
Como mencionei, muitos organismos não humanos enganam os outros, às vezes até pela forma. Por exemplo, alguns insetos se parecem com fezes de pássaros, o que os protege de serem comidos. Esses comportamentos instintivos são todos produtos da evolução. O caso humano é mais complicado. Alguns de nossos comportamentos desonestos podem ter sido estabelecidos em nossa espécie por seleção natural, mas, para a maior parte dos humanos, a melhor explicação é pela evolução da inteligência social.
A estrutura de nossa mente pode ter sido moldada por essa necessidade de enganar?
Até o momento podemos apenas especular sobre isso. Minha visão é que evoluímos como primatas altamente sociais. Para ter sucesso em grandes e complexos grupos sociais, é necessário um alto nível de inteligência social. Uma importante parte da inteligência social é o gerenciamento da maneira como os outros nos percebem, e mentir é uma das maneiras de fazermos isso. Então, não acho que somos moldados pela evolução para mentir, mas fomos moldados para ser socialmente inteligentes, e isso nos permite mentir.
Explique por que a enganação, a mentira e a falsidade estão no cerne da nossa herança cultural?
As grandes obras da literatura são em grande parte sobre mentiras e decepções, assim como filmes e programas de televisão. O livro de Gênesis na “Bíblia” está cheio de histórias sobre mentiras: Deus e a serpente mentem para Adão e Eva. É claro que a religião é uma grande mentira.
A mentira tem seu lado positivo? Qual seria?
Tem muitos aspectos positivos. A sociedade humana não poderia existir se nós não mentíssemos todos os dias. Uma pessoa que não saiba mentir bem é pouco provável que seja bem-sucedida na vida. Claro, muitas vezes não identificamos isso como mentira e chamamos esse comportamento de “diplomático”, “educado”, ou “estratégico”. Mas essas expressões evasivas são apenas uma maneira de mentir sobre mentir.
Por isso, dizemos que existem mentiras do bem (branca) ou mentiras do mal?
Sim. É incorreto dizer que mentir é sempre moralmente errado. Por exemplo, seria inocente dizer que mentir para proteger os outros (ou a si mesmo) de algum dano é imoral. As mentiras que promovem a injustiça, o dano ou o sofrimento são moralmente erradas.
Você acredita que a mentiras faz o cérebro adaptar-se à desonestidade?
Quanto mais praticamos qualquer coisa, melhor conseguimos ser. No entanto, a mentira começa cedo, durante a primeira infância. A capacidade de mentir é estabelecida até os 4 anos ou até mais cedo. E, quando nos tornamos adultos, temos uma grande bagagem de prática. Então, praticamente todos nós estamos adaptados à desonestidade.
Por isso você diz que o mentiroso é também mais inteligente, pois fala aquilo que as pessoas querem ouvir?
A habilidade em mentir é um aspecto da inteligência social, e as pessoas socialmente inteligentes são quase sempre virtuosas ao mentir. Às vezes, isso é prejudicial, e, às vezes, não. É errado pensar que a inteligência está ligada à moralidade. Algumas das pessoas mais destrutivas (por exemplo, Hitler) também foram bastante inteligentes.
Acreditar na própria mentira pode fazer mal?
Não necessariamente. Por exemplo, todos nós fingimos que o mundo não está cheio de sofrimento, que nossos entes queridos não morrerão, e assim por diante. Isso nos dá tranquilidade. Os psicólogos descobriram que a saúde mental está relacionada com níveis ideais de autoengano e que as pessoas deprimidas mentem a si mesmas com menos frequência. Mentir para nós mesmos também pode nos ajudar a mentir de forma mais eficaz. Se você acredita em suas próprias mentiras, elas serão mais convincentes para os outros.
A partir de quanto a mentira passa a ser patológica (mitomania)?
A chamada “mentira patológica” é uma espécie de mentira incompetente. A pessoa mente sem razão. Está mentindo por mentir.
Qual a diferença entre mentir e omitir?
Mentir pode ser não verbal. Nós podemos fazê-lo sem dizer nada. Então, se a omissão tem a função de fazer com que os outros formem falsas crenças, isso conta como mentira.
É possível perceber sinais da mentira?
Sim, claro. As pessoas muitas vezes estão ansiosas quando mentem. Sinais de nervosismo podem indicar que uma pessoa está mentindo. No entanto, isso nem sempre é confiável. As pessoas que são mentirosas muito habilidosas ou que acreditam em suas próprias mentiras podem não mostrar sinais de nervosismo, e as pessoas podem mostrar sinais de nervosismo mesmo quando não estão mentindo. Não existe um método mágico.
Por que você diz que os políticos são mentirosos profissionais?
Os políticos são vendedores, e o que eles vendem são, muitas vezes, ilusões. Eles são mestres de manipular nossos medos, esperanças e apresentar imagens falsas ou enganosas de si mesmos, do estado do mundo e do que eles farão. É simplesmente impossível ser um político de sucesso sem ser um mentiroso habilidoso. Além disso, esperamos que os políticos digam o que queremos ouvir. Nós exigimos ilusões e esperamos que os políticos as entreguem.
O Tempo
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