sexta-feira, 14 de abril de 2017

Caixa 2 era 75% de campanhas

O Tempo

CONTABILIDADE

A Sergio Moro, Marcelo Odebrecht afirmou que políticos “precisavam” da verba não oficial




PUBLICADO EM 14/04/17 - 03h00

BRASÍLIA. Em depoimento ao juiz federal Sergio Moro, que conduz as ações da Lava Jato na primeira instância em Curitiba, o herdeiro do grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht, afirmou que o pagamento a políticos via caixa 2 era recorrente na empreiteira. Em uma de suas planilhas, as doações eleitorais oficiais eram identificadas como “bônus”. “Três quartos do custo estimado das campanhas (75%) era caixa 2. Então, o pessoal precisava de caixa 2”, disse o executivo, em audiência na última segunda-feira.

Em trecho de uma de suas delações ao Ministério Público Federal, Marcelo afirmou que não conhece político eleito no país sem o caixa 2: “Não existe ninguém no Brasil eleito sem caixa 2. O cara até pode dizer que não sabia, mas recebeu dinheiro do partido que era caixa 2”.

A Moro, Marcelo admitiu que a Odebrecht estruturou um departamento de propinas no início da década de 1990, simultaneamente ao escândalo dos Anões do Orçamento, em 1993, e à internacionalização da companhia. A ideia era acabar com o “descontrole total” da contabilidade e continuar atendendo às demandas dos políticos. Com isso, passou a pagar propinas no exterior – chamadas pelo empreiteiro de “pagamento não contabilizado”. Os presidentes de cada unidade de negócios tinham autonomia para fazer seus pagamentos.

Parte deles era efetuada em offshores. Outra parte, paga em dinheiro, por meio de doleiros que recebiam os valores da Odebrecht no exterior e se encarregavam de convertê-los para reais. “Essa questão de eu ser o grande doador, no fundo, é, também, para abrir portas”, afirmou.

Segundo o ex-executivo da empreiteira, qualquer pedido que ele fizesse a um político no Brasil, mesmo que de um pleito legítimo, gerava uma “expectativa de retorno financeiro”. “Infelizmente, em toda relação empresarial com um político, por mais que o empresário peça pleitos legítimos, no fundo, tudo gera uma expectativa de retorno”, afirmou.

No depoimento, Marcelo também confirmou que o apelido “Italiano” era uma referência ao ex-ministro Antonio Palocci, tido como seu principal interlocutor no governo do PT, e “Amigo” era o codinome do ex-presidente Lula. Ele voltou a afirmar que se sentia “o bobo da corte”, ao assumir projetos caros por pressão do governo federal, como os estádios da Copa.

“É um absurdo. O governo cria os problemas para a gente, e, depois, quando a gente entope nossa agenda para solucionar, eles criam a expectativa de que a gente vai doar”, afirmou. “A gente fica lá mendigando para o governo resolver os problemas que me criou”.

O executivo também contou um episódio em que o ex-ministro Guido Mantega teria dito, em meio à negociação de um programa de refinanciamento, que tinha a expectativa de que a Odebrecht doasse R$ 50 milhões à campanha da ex-presidente Dilma Rousseff em 2010. Esse valor está incluído nos créditos da planilha “Programa Especial Italiano”. Mantega, nessa tabela, é referido como “Pós-Itália”.

“Ele não chegou para mim e falou: ‘Olha, só vou fazer isso por causa disso’. Mas a gente estava discutindo um assunto, ele botou (o valor) no papel e disse que tinha a expectativa”, contou.
‘Doação’. Delator da Odebrecht diz que a empresa doou R$ 360 mil – via caixa 1 e caixa 2 –, entre 2006 e 2010 para Manuela d’Ávila (PCdoB-RS), ex-deputada federal e, hoje, deputada estadual.
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