segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Juca Kfouri revisita sua vida


O TEMPO

“CONFESSO QUE PERDI”



Jornalista lança autobiografia, recheada de casos dignos de “Forrest Gump”, em que reafirma sua herança política


PUBLICADO EM 25/09/17 - 03h00





RIO DE JANEIRO. Juca Kfouri tinha 6 anos quando seus pais o enviaram para a casa de familiares em Ilhéus, na Bahia, para que o garoto tratasse uma tuberculose ganglionar. Após alguns dias na cidade, a febre tinha passado e seu tio Pacheco prometeu levá-lo num jogo que o Fluminense faria na cidade vizinha de Itabuna. A febre voltou, Juca perdeu o jogo, mas o tio preparou uma surpresa: levou o goleiro Castilho, os pontas Escurinho e Telê Santana, e todo o time tricolor, para uma visita ao garoto adoentado.

Quase três décadas depois, Juca recebeu Castilho e Telê, de quem se tornou amigo, num programa de TV que apresentava. Em certo momento, perguntou a Castilho se era comum, na sua época de jogador, visitar crianças doentes em hospitais ou casas de família. O ex-goleiro disse que em casa de família lembrava apenas de uma ocasião, em que o time visitou um menino paulista na Bahia, que ele acreditava ter morrido “porque estava muito fraquinho”. Ali mesmo, no ar, Juca revelou que o garoto era ele, e Castilho, de olhos marejados, lhe deu um abraço emocionado.

A história é apenas uma entre muitos causos dignos de um “Forrest Gump”, como o próprio jornalista define no seu livro de memórias “Confesso que Perdi” (Companhia das Letras). Os episódios narrados, inclusive, parecem desdizer o título. Juca conta que seu filho mais velho, o também jornalista André, e sua mulher detestaram a escolha – que faz referência às memórias do poeta chileno Pablo Neruda, “Confesso que Vivi”. Mas ele defende.

“Sem nenhuma demagogia, é claro que profissionalmente eu não perdi, na minha vida familiar eu não perdi. Mas aos 17 anos eu estava envolvido na resistência à ditadura. Minha carreira como jornalista se caracteriza muito pela minha luta pela moralização do futebol brasileiro. A minha geração não vai deixar o Brasil que eu sonhei para os meus filhos e netos. A desgraça dos cartolas (como a prisão de Carlos Arthur Nuzman) não faz a minha alegria”, diz Juca.

A relação do jornalista, na juventude, com grupos armados que lutaram contra a ditadura é uma das revelações do livro. Ele conta que sua formação política se deu através de dois primos mais velhos, os irmãos João e Maria Lygia Quartim de Moraes. Sua indignação – herança também do pai, o procurador de justiça Carlos – foi combustível da sua carreira como jornalista. À frente da revista “Placar”, que marcou época na década de 1980, ele pode dirigir seu inconformismo para um assunto que até então não recebia o mesmo tratamento da política e da economia.

Aos 67 anos, Juca confessa que não é mais tão otimista com o futuro, mas não perde a esperança. “Se você me fizesse essa pergunta em 1990, eu te diria que em 2000 a gente estaria vivendo num país muito melhor, o futebol brasileiro teria varrido essa gente, porque é bom demais para ficar na mão deles. Estamos em 2017 e não tenho coragem de dizer que em 2027 isso vai acontecer. Isso não faz que eu desanime ou perca a esperança. Não tenho outra profissão. Vou morrer jornalista”, confessa.

O Tempo

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