segunda-feira, 25 de março de 2013

A Bela Adormecida Segundo a Poetisa Adélia Prado

Estou alegre e o motivo beira secretamente à humilhação, porque aos 50 anos não posso mais fazer curso de dança, escolher profissão, aprender a nadar como se deve.
No entanto, não sei se é por causa das águas, deste ar que desentoca do chão as formigas aladas, ou se é por causa dele que volta e põe tudo arcaico, como a matéria da alma, se você vai ao pasto, se você olha o céu, aquelas frutinhas travosas, aquela estrelinha nova, sabe que nada mudou.
O pai está vivo e tosse, a mãe pragueja sem raiva na cozinha.
Assim que escurecer vou namorar.
Que mundo ordenado e bom!
Namorar quem?
Minha alma nasceu desposada com um marido invisível.
Quando ele fala roreja quando ele vem eu sei, porque as hastes se inclinam.
Eu fico tão atenta que adormeço a cada ano mais.
Sob juramento lhes digo: tenho 18 anos. Incompletos.

Adélia Prado

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