MG: famílias circenses podem se tornar patrimônio imaterial brasileiro
Documentação para registro foi entregue ao Iphan de Belo Horizonte
Acrobacia, malabares, equilíbrio, trapézio, palhaços, mulher barbada, pirofagia, apresentação de teatro e shows musicais são espetáculos de números circenses que integram a documentação referente à instauração de processo de registro das famílias circenses como patrimônio imaterial brasileiro.
O processo foi solicitado em novembro, junto ao Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), por Sula Mavrudis e Mayara Mattos, membros do Conselho Estadual de Política Cultural (Consec), do segmento Circo, ligado à Secretaria de Estado de Cultura. Elas requerem a apreciação e o registro para que seja realizada salvaguarda da cultura circense no Brasil.
Sula Mavrudis, que além de membro do Consec é da Rede de Apoio ao Circo (RAC), destaca a importância da salvaguarda das mais de 100 famílias de circos tradicionais para preservação cultural das famílias circenses em Minas Gerais.
“Esta é uma cultura que enriquece e contribui para a história cultural do país e merece ser preservada em Minas Gerais. Por isso, o reconhecimento como patrimônio imaterial é fundamental para realização de ações de salvaguarda no estado", diz a especialista.
"O circense se sente circense por passar seu conhecimento de pai para filho; por ter uma vida debaixo da lona, onde tudo acontece nesse micro e macro cosmos ao mesmo tempo", ilustra Sula.
Segundo ela, a salvaguarda vai possibilitar que as famílias circenses sejam reconhecidas nos estados em que circulam para que possam receber atendimento de saúde, educação, assistência social e também tenham um endereço para que possam participar dos serviços oferecidos à comunidade.
Sula ressalta, ainda, que a vida das famílias circenses é essencialmente nômade - de aventuras, riscos, emoções e sonhos - e esta carcarterística fundamental precisa ser desestigmatizada e oficialmente reconhecida.
Integração à sociedade
De acordo com o secretário adjunto e superintendente de Interiorização e Ação Cultural, órgão também ligado à SEC, João Miguel, a integração das famílias circenses à comunidade é uma preocupação do atual Governo. Segundo ele, o reconhecimento como patrimônio imaterial brasileiro traz à cena da cultura do estado a visibilidade necessária para que esse povo seja integrado à sociedade e tenham seus direitos atendidos.
O processo para que as famílias sejam integradas à sociedade e às comunidades iniciou no dia 5 de novembro – Dia Nacional da Cultura – com a assinatura do Protocolo de Intenções por mais de 40 prefeitos, até o momento, para que esta manifestação cultural possa entrar para o repertório da cultura estadual.
“A superintendência de Interiorização e Ação Cultural trabalha, agora, para que o circo e suas famílias possam se instalar em espaços próprios nos municípios, reconhecidos como endereço, visando o atendimento à saúde, educação, assistência social, água, esgoto, luz que garantam o direito dessas famílias para que o circo possa se instalar e circular pelo estado”, diz João Miguel.
O secretário de Estado de Cultura, Angelo Oswaldo, destaca a relevância da iniciativa. “Os grupos familiares circenses se constituem, de fato, em notável núcleo cultural guardião milenar das artes e saberes do mundo do circo. Reconhecer essa importância, visando à proteção e à salvaguarda da família circense, torna-se um dever das políticas públicas de cultura", enfatiza o secretário.
Dossiê
O dossiê para reconhecimento como patrimônio imaterial entregue ao Iphan é composto de um esboço histórico das famílias tradicionais de circo que vieram para o Brasil e outras que se configuraram nesses últimos séculos pela produção social e artísticas dos circenses em território nacional, um material jornalístico e um pequeno acervo fotográfico que registra a rotina circense em Minas Gerais.
A documentação traz a caracterização dos modos de vida e da expressão identitária das famílias circenses, seus fazeres artísticos, assim como os mestres e mestras responsáveis pela perpetuação dessa tradição tão antiga e rica que se consolida a cada geração.
Origem das famílias circenses
Existem muitas histórias que confirmam as trajetórias do circo e elas vêm de longe e estão sempre em movimento. O surgimento do circo como local de manifestações artísticas é questionável, mas há menções que remontam as origens da arte circense a pinturas encontradas na China, datadas de mais de 5.000 anos.
Gravuras de malabaristas visualizadas nas pirâmides do Egito, objetos de barro e pedra na Ilha de Creta (1800 a.C.) e painéis em tumbas egípcias (1180 a.C.) também traziam representações dessa arte – acrobacias, saltos, equilíbrio, exibição de força elasticidade, entre outros.
O primeiro circo foi fruto da ideia empreendedora do militar britânico Philip Astley no século XVIII, que compunha seus espetáculos, organizados e estruturados num picadeiro, à base de apresentações artísticas que incluíam o cavalo.
Já o circo moderno teve início com a delimitação do espaço próprio para este tipo de espetáculo, da estrutura empresarial que passou a ser criada e da incorporação pelas famílias de saltimbancos a valores e rituais próprios da aristocracia militar do século XVIII.
No Brasil, o circo foi itinerante desde sua origem. Ao chegarem as primeiras famílias, ainda não se conhecia a estrutura americana, mais prática e que permitia maior facilidade nas montagens e desmontagens.
Contando com os conhecimentos técnicos e a tradição que traziam de seus países de origem, os circenses que chegaram ao Brasil e rapidamente adaptaram-se às novas condições encontradas no país. No início do processo de imigração dos artistas e suas troupes se reproduziu a forma original de apresentação herdada dos saltimbancos: a praça pública.
Costumes e resistência
Reunindo em torno de seus espetáculos as novidades ou atrações com que se deparavam em suas viagens constantes, o circense incorporou línguas, costumes, saberes e foi construindo suas tradições que são constantemente reinventadas.
Diferentes grupos foram se integrando como os adestradores e ourives ciganos, os equilibristas chineses e japoneses, os contorcionistas indianos, além dos vários artistas provindos de diferentes países da Europa.
Estas circunstâncias deram ao circo a capacidade de sobreviver a qualquer situação, podendo deslocar-se com facilidade de acordo com as necessidades ou as possibilidades que se apresentassem.
Desse modo, a tradição das famílias circenses foi se consolidando, e apesar das grandes dificuldades, os circenses resistem até hoje.
JB
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