segunda-feira, 27 de julho de 2020

A falta do mito e do fogo

* Amadeu Garrido de Paula

O momento atroz conduz o inconsciente do homem à mitologia. Ao ver um vírus matar diariamente e a medicina correr o quanto pode, faz falta um titã que nos liberte. 
Prometeu foi o mito dos atenienses. Tudo descontado, no mínimo fazia crescer suas energias de autodefesa. As histórias mitológicas talvez tenham sido mais eficientes do que os modernos barbitúricos.
O mito criou o homem. Do  barro, inteligente e sábio, porque Prometeu roubou dos Deuses o fogo da sabedoria e nele o inoculou. As outras criaturas tiveram de contentar-se com unhas, garras, pelugens, asas e carapaças.  
Zeus, o deus dos deuses, não era infinitamente bom. Ao contrário. Isso o levou a acorrentar o mito a uma rocha, onde uma grande ave faminta comia toda noite seu fígado. Porém, este se regenerava no dia seguinte. A lenda mitológica do "Prometeu Acorrentado". 
Não obstante, o titã continuou sendo o grande defensor da humanidade. Nosso inconsciente coletivo ainda o aguarda. Tudo é válido em nosso mundo oculto e mágico.  
Até a cloroquina. Deusa da mentira e do engano, Juna que nos conduz pelo mar de lágrimas em direção às trevas. Pior, reverenciada por um ignaro fruto de barro degradado, que jamais evoluiu sob o fogo da inteligência,  ocupante do ápice da pirâmide do poder temporal.
Hércules libertou Prometeu para continuar sua sacrificada luta em prol do homem. Ele cumpriu gloriosamente sua missão, que nos trouxe a este século. Melhor seria que nosso povo, em quarentena, separados os viventes para lançar as gotas do vírus no vácuo, pacientemente fugisse do mal e da morte, trocando pensamentos de uma literatura mitológica, coisa jamais conhecida de nossa barbárie. Seguiríamos o mito titânico, enquanto nossa deusa ciência completasse sua jornada. Não nos aglomeraríamos sem máscaras, auxiliando um organismo invisível e cruel que tem levado muitos dos nossos irmãos perplexos, abatidos e inconformados,  de volta ao barro de que foram feitos.
Somente roubando novamente o fogo divino para, com um mínimo de inteligência, enfrentar com coragem os genocidas.

* Amadeu Garrido de Paula, poeta e ensaista literário, é advogado, atuando há mais de 40 anos em defesa de causas relacionadas à Justiça do Trabalho e ao Direito Constitucional, Empresarial e Sindical. 

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