quarta-feira, 16 de maio de 2018

Somos o solo ou as plantas?

Amadeu Garrido de Paula

Num momento histórico passível de semelhanças com outros, reflitamos. Talvez a única diferença sejam investigações policiais e procedimentos jurídicos que ocupam nossos meios de comunicação. Eles turvam de apreensões nossa realidade, mas é a intimidade, ainda não profunda, dos fatos perversos de nossa política que vêm à tona. Em passados, ficavam sob os tapetes.

O desafio, porém, é enorme. Temos encruzilhadas pela frente e nossos passos devem trilhar o melhor caminho. Poderemos errar e posteriormente arcar com um alto preço.

Antes dos livros, revistas, jornais, marketing e comentários dos botecos,  deve erguer-se nosso cérebro crítico. As experiências do passado podem e devem nos auxiliar, mas também as do mundo cotidiano. O método do homem político - e todos o somos - consiste em afastar uma conduta receptivo-passiva e  refletir muito, não raro com nossos próprios botões.

Nesse sentido, este próprio artigo deve ser considerado com ressalvas.

Entretanto, é preciso perceber e sentir que vivemos um presidencialismo: um só ungido pelas urnas determinará nosso destino por muito tempo. E amarrado a compromissos deturpadores da boa política, porque é "presidencialismo de coalizão". Não é necessário enfatizar os males que esse regime nos acarreta.

A mulher ou o homem  a elegermos, portanto, deverá reunir experiência no trato da coisa pública e independência. Qualidades aparentemente paradoxais. Por outro lado, deverá ter uma visão ampla, estruturada, harmônica, abrangente, de como administrar este imenso País. São inócuas reformas segmentadas, como as propostas pelo governo atual, sem vínculos com a ciência econômica, social, jurídica e das finanças públicas. Somente uma personalidade assim equipada estará pronta para enfrentar de modo científico a problemática global da nação. Talvez a tenhamos, talvez não, talvez devamos optar pelo menos ruim. Não as reformas, mas a reforma, congruente. A ver.

O importante é não ser como o solo, amarrado por suas raízes, mas libertos como as plantas que crescem ao ar livre, a um tempo espontâneas e sábias. "De dias úmidos e turvos, da solidão, das palavras sem amor que escutamos, à maneira de cogumelos: surgem numa manhã, não sabemos de onde, e olham para nós, cinzentos e ranzinzas. Ai do pensador que não é o jardineiro, mas apenas o solo de suas plantas." (Nietzsche, Aurora, § 382).

Amadeu Garrido de Paulaé Advogado, sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados.

Esse texto está livre para publicação.

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