quarta-feira, 30 de maio de 2018

'Um monte de líderes' dos caminhoneiros surge no WhatsApp

O Tempo

Vozes do sindicato e das entidades de classe têm sido questionadas na rede


PUBLICADO EM 30/05/18 - 03h00

Em mais de 20 anos de liderança, o presidente da União Nacional dos Caminhoneiros (Unicam), José Araújo Silva, o “China”, diz que nunca viveu situação semelhante e não faz ideia de como o governo vai resolver a greve. “Virou uma situação sem controle”, diz ele. Nos 15 pontos de paralisação sob a bandeira da entidade, nenhum encerrou os protestos, apesar das ponderações de China sob o acordo anunciado pelo presidente Michel Temer. 

Para ele, uma das marcas dessa greve é a ampla utilização do WhatsApp, que criou um “monte de líderes” no movimento. Ao contrário do que ocorria em paralisações passadas, dessa vez a voz do sindicato e das entidades de classe tem sido questionada e abafada pela disseminação das opiniões no aplicativo. Nos últimos dias, a cada anúncio do governo, milhares de caminhoneiros tinham respostas imediatas em mensagens disparadas nos grupos da categoria. 

Democracia direta. O sociólogo Massino Di Felice, professor da Universidade de São Paulo (USP) e autor de vários livros sobre comunicação digital, afirma que esse é o resultado de uma grande passagem para o que ele chama de democracia direta. Por meio dos grupos de WhatsApp, as pessoas passam a organizar as informações sem a necessidade de um representante. 

“Ninguém representa ninguém. Todos podem emitir suas opiniões e organizar as informações”, diz ele, que estudou as manifestações da Primavera Árabe, em 2010, no Oriente Médio, e os protestos no Brasil, em 2013, organizados pelas redes sociais. Na avaliação do sociólogo, o problema é que a política tradicional ainda não descobriu uma forma de lidar com esse novo cenário. 

As últimas ações do governo mostram uma dificuldade enorme para controlar a situação, já que os manifestantes não se sentem representados pelas lideranças. Nessa segunda-feira (28), nos grupos de WhatsApp, os caminhoneiros chamavam os representantes que aceitaram o acordo de “traidores”. “(Eles) se renderam e se venderam”, afirmava um participante sobre sindicalistas, em áudio. Na mensagem, o manifestante incitava os demais para se juntarem e “darem um pau” em um sindicalista. 

China, da Unicam, afirma que a situação foi agravada pelo descaso dos governos em relação aos motoristas de caminhões. “Nos últimos anos, passo, pelo menos, dois dias em Brasília para tentar criar um marco regulatório para o setor, e nada foi decidido. Agora o governo tem um abacaxi no colo para resolver”. Junta-se a isso o fato de os caminhoneiros sentirem que têm o poder nas mãos. Isso está claro nos grupos de WhatsApp”, disse.

O Tempo

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