domingo, 3 de setembro de 2017

Câmara vota contra população

Na teoria, os parlamentares devem representar os interesses de quem os elegeu. Porém, na prática, as últimas votações importantes do Congresso Nacional mostraram um total distanciamento entre o que pensam os eleitores e como votam os políticos. Para analistas, esse descolamento pode trazer efeitos negativos para quem hoje ocupa um mandato no Legislativo e até mesmo proporcionar uma renovação recorde nas eleições de 2018. Porém, esse cenário depende da continuidade da crise política. Já os congressistas apostam suas fichas na melhoria da economia para provarem que os eleitores escolheram o caminho certo.

Esse desalinhamento entre a classe política e o eleitor esteve presente nas três últimas votações de matérias relevantes no Congresso. Foi assim na denúncia contra o presidente Michel Temer (PMDB), na reforma trabalhista e na PEC do Teto de Gastos. Em todos os casos, pesquisas apontavam uma rejeição da população de mais de 60% aos temas, o que não foi suficiente para convencer os parlamentares.

Para o cientista político e professor da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer, esse grande distanciamento pode provocar uma renovação de até 70% das cadeiras da Câmara dos Deputados em 2018. Porém, ele destaca que tudo vai depender de como o cenário político caminhará até a eleição do ano que vem.

“Quanto mais perto da disputa, maior o impacto dessas votações favoráveis a temas impopulares por parte dos deputados. Teremos, ainda, a reforma da Previdência e, provavelmente, mais duas denúncias contra o presidente Michel Temer. Tudo isso pode gerar uma rejeição aos políticos tradicionais nas eleições do ano que vem. Aliás, esse é o dilema do PSDB, sempre avaliando se é melhor manter-se no governo ou desembarcar para se livrar de um desgaste que possa atrapalhar as votações de 2018”, avaliou.

A cientista política e professora da Universidade Federal de São Carlos Maria do Socorro Sousa Braga também ressalta a importância do cenário político dos próximos meses, mas destaca que esse impacto é maior na parcela do eleitorado mais crítico. “Aquele eleitor que acompanha o noticiário com as seguidas denúncias certamente será influenciado. Esse eleitor não votará nos candidatos que foram contra o que ele pensava. Mas, até para essa pessoa, o impacto será maior com as próximas denúncias contra esse governo. É preciso lembrar que vários deputados estão envolvidos nas denúncias que também afetam o Planalto. Tudo isso traz uma sensação de impunidade que afeta toda a classe política e gera um rejeição nas urnas”, analisa a especialista.

Porém, Maria do Socorro é mais cética em relação a uma renovação contundente do Congresso. “Existe uma outra parte do eleitorado que é menos crítico, e, para essa parte, o que pesa mesmo é o momento econômico. Então, para que esse distanciamento de posições vire rejeição nas urnas, vai depender muito de qual será a situação econômica quando chegar a eleição do ano que vem”, diz.

EM MINAS

Apoio. A bancada mineira na Câmara votou em sentido oposto à vontade da população, retratada em pesquisas, tanto na denúncia contra Temer quanto na PEC do Teto e na reforma trabalhista.


“O ELEITOR VAI COMPREENDER”

Os deputados que votaram contra a vontade da população afirmam que, com o tempo, seus eleitores entenderão que as medidas que tomaram “foram o melhor” para o Brasil. Eles apostam na recuperação da economia e no consequente aumento de emprego e renda para combater o desgaste gerado pelas votações. “No caso da votação contra o presidente Michel Temer (PMDB), não poderíamos gerar uma instabilidade que atrapalharia a retomada da economia. Nenhum investidor leva a sério uma nação que troca o presidente pela segunda vez em pouco mais de um ano”, afirmou Caio Nárcio (PSDB-MG).
Segundo o tucano, a queda de Temer implicaria em piora do cenário econômico e em desgaste ainda maior para os políticos. “A população vai compreender a posição que nós tomamos a favor do país. Problemas na economia provocam um desgaste em toda a classe política, porque a população credita o desemprego, a falta de renda aos políticos”, finalizou.

O deputado Delegado Edson Moreira (PR-MG) segue a mesma linha de justificativa. “Eu procurei o que era o melhor para o país. O Brasil não aguentaria mais uma troca de presidente e as consequências dela para a economia. Com certeza, meus eleitores vão entender e manterão o seu voto. Se se quer estabilidade e melhoria da economia, é com essas medidas. Se não se quer melhora da economia, aí não adianta argumentar”, afirmou.

Edson Moreira sustenta que os deputados que são contra a reforma da Previdência e a favor da denúncia contra Temer são os mesmos que votaram “contra o desejo da população” para manter a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) no Planalto.
O Tempo

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