sábado, 10 de junho de 2017

Correndo em busca do sonho


Ela foi demitida, não tinha dinheiro, estava acima do peso, era sedentária e fumava. Aos 44 anos, começou a correr não só atrás do prejuízo, mas também em maratonas oficiais – uma vontade que veio do nada, agradou e já dura três anos. Em 2016, a relações-públicas Laura Barreto, 47, colocou na cabeça que realizaria em cinco anos o sonho de participar das dez maratonas mais difíceis do mundo – até o momento, correu em duas, na China e no deserto do Atacama, e sem dinheiro, sempre arrumando um jeito criativo e solidário de financiar as viagens.

Há dois meses encontrou a razão de ter aderido a esse esporte: ser madrinha do projeto Corredores da Rua, para incentivar pessoas em situação de rua a encarar a maratona da vida correndo. “Ainda não tinha entendido o sentido disso. E, quando eu fui convidada para esse projeto, falei: ‘É isso!’”, orgulha-se.

Parece uma fórmula mágica: não ter emprego fixo, viajar o mundo, sustentar-se e ainda ajudar o próximo. E Laura também é mãe de duas adolescentes, de 12 e 13 anos. “Ficar pobre foi bom”, nas palavras dela, pois descobriu-se blogueira, escritora, artista, palestrante, comediante e, há três anos, atleta. “Quando você não tem nada a perder, arrisca ser feliz”, diz como um mantra.

“Com força de vontade, disciplina e fé, somos capazes de muito”, ressalta Laura. A pista que ela percorre exige coragem e um bocado de cara de pau. Bem relacionada, ela tem, atualmente, 300 mil seguidores na fanpage do blog Ócio do Ofício. A escolha do nome se deu porque a página surgiu nas horas vagas, quando trabalhava no “Seu imóvel é no Zap”, brinca, e ganhava “dois dígitos”. “Hoje, deveria chamar Ofício do Ofício”, ri.

Agora, por meio do blog, pede tudo quanto é favor para seguidores e amigos, faz vaquinha, vende brigadeiro e dá seus pulos – tem como marca, hashtag e tatuagem: #voucorrendo. “Descobri que emprego suga a alma; quanto mais você ganha, mais quer ganhar. Não quero isso para minha vida nunca mais”, diz. Chutou o balde e foi criticada pelos irmãos, uma médica e um funcionários de uma empresa multinacional, ambos bem-sucedidos.

Café. Encontramos Laura no Mocca Coffee and Meals, um restaurante-cafeteria fino no bairro Belvedere, na região Centro-Sul de Belo Horizonte. Estilosa, tem os cabelos loiros curtos e usa colares vultosos, feitos por ela. “O café com caramelo e flor de sal é uma delícia”, indica. É recepcionista do local das 11h às 15h, serviço que lhe garante R$ 1.000 por mês. Mas Laura acaba de ser promovida a gerente do estabelecimento e vai ganhar “um quarto dos dois dígitos que recebia antes” – uma conquista que ela nos revela emocionada após três anos desempregada.

Laura fez dos perrengues uma contação de casos no blog. Antes, falava sobre marketing – é pós-graduada na área. “Ninguém queria ler”, lembra. Desistiu. Resolveu “ser de verdade”: “Vou escrever sobre bobagem, filhas, paquera no (supermercado) Verde Mar”. O texto virou esquete de teatro, e de repente a página tinha 1.500 acessos por dia.

Já a ideia de fazer maratonas solidárias veio quando ela ainda era empregada. Iria correr na Holanda, de férias, e, de quebra, fechou com a empresa de doar ao hospital Mario Penna R$ 1 por cada pessoa que ela passasse na frente. Eram 15 mil participantes, ela planejava ficar na metade e arrecadar R$ 7.000. Arrumou treinador, cardiologista, nutricionista, fisioterapeuta e ortopedista de graça.

Só que não seria tão fácil assim. Um problema no fêmur ameaçou os planos, mas, mesmo assim, ela correu, durante quatro horas, 42 km (como de BH a Confins), chorando de dor. Ficou entre os últimos, angariando apenas R$ 1.500. Depois, um empresário doou o restante planejado. Na maratona da China, já recuperada, vendeu para o Hospital da Baleia cada um dos 5.164 degraus que subiria. Ficou em 14º lugar entre 800 pessoas. No deserto do Atacama, no Chile, subiu no segundo lugar do pódio ao correr 42 km.
O Tempo

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