domingo, 18 de junho de 2017

Eleitor crítico, porém distante

As eleições de 2018 se aproximam em meio a um cenário de desconfiança e instabilidade política. Se, por um lado, os escândalos revelados pela operação Lava Jato têm preocupado políticos investigados que tentarão se reeleger, por outro, os eleitores estão diante da oportunidade de mostrar, nas urnas, sua insatisfação com os esquemas de corrupção e as arrecadações ilícitas que vêm sendo denunciados.

Especialistas ouvidos pela reportagem de O TEMPO acreditam que as próximas eleições terão uma importância peculiar na história política brasileira. Na busca pela manutenção do foro privilegiado, candidatos à reeleição que tenham sido citados em delações, por exemplo, devem empenhar-se como nunca.

Na outra ponta, o papel que terá o eleitor no pleito ainda não é certo. Segundo analistas, parte do eleitorado tende a se engajar e se comportar de forma mais vigilante e crítica, enquanto outros provavelmente acabarão distanciando-se, podendo inclusive deixar de votar por um descrédito com relação à classe política como um todo.

“Antes da Lava Jato, já havia um apartidarismo grande por parte do eleitorado por várias razões. Quando chega a operação, vem mais um elemento para aumentar a descrença com a classe política”, afirma Maria do Socorro Braga, doutora em ciência política e professora da Universidade Federal de São Carlos.

A professora acredita que o Brasil tem hoje um eleitor muito mais crítico, com potencial para se tornar de fato participativo. Por outro lado, o aumento da descrença também pode acabar sendo expresso por meio do voto de protesto: nulo, branco ou abstenção. “Podem surgir várias reações, inclusive a aposta em um candidato que não tenha nenhum envolvimento na operação”, analisa Maria do Socorro.

Antipolítica. Na avaliação do cientista político Lucas Cunha, pesquisador da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), os eleitores já estão saturados do contexto da política nacional: “É difícil avaliar agora, mas, de modo geral, o eleitor tende a surfar um pouco no momento da antipolítica. As eleições de 2016 mostraram como será esse contexto de 2018: muitos candidatos se elegeram dizendo que não são políticos, rejeitando o próprio termo ‘política’”. Cunha ressalta, contudo, que essa rejeição é prejudicial à jovem democracia brasileira. “A rejeição reforça os elementos de distanciamento da política, como se os problemas pudessem ser solucionados de fora”, diz.

Coordenadora da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), Geórgia Nunes concorda que os eleitores a cada dia têm-se interessado menos pela política, acreditando que não vale a pena votar, já que todos os políticos “são iguais”. “Posso estar errada e espero que esteja, mas acho que vamos ter uma abstenção muito grande na próxima eleição”, sugere.

Para ela, essa generalização é ruim: “A decisão por quem vai ser o representante tem que ser sempre do eleitor; ele é o soberano. Mas, infelizmente, o que a gente tem percebido é que esse protagonismo tem ficado mais no Judiciário, em razão da quantidade de questionamentos sobre candidaturas e também pela demonização dos políticos, que acaba por afastar o eleitor”.

Como a maioria das investigações de senadores, deputados e governadores com foro privilegiado dificilmente será concluída antes de 2018, o mais provável é que seu julgamento seja feito nas urnas: “Por isso é importante que o eleitor busque informações, e não fique afastado da política”.
Risco. Especialistas alertam que o momento de rejeição é propício ao surgimento do “salvador da pátria”, candidato aventureiro com pouca ou nenhuma experiência política, que pode trazer riscos.


MINIENTREVISTA

Maurício Vargas
Presidente do Reclame Aqui e responsável pelo projeto Vigie Aqui

Como surgiu a ideia do projeto Vigie Aqui?

Nós, que trabalhamos diretamente com o consumidor, entendemos que existe uma oportunidade grande de ajudar o país na relação do cidadão com o político. Uma agência nos colocou isso: ‘Vamos fazer um plug-in’, aí melhoramos a ideia e lançamos. É um projeto totalmente apolítico, com a intenção de compilar informações dos políticos, já que é muito difícil para o cidadão comum procurar os processos. A informação já existe, mas os dados estão jogados. O que nós fizemos foi compilar e colocar em um plugin. Depois de baixá-lo, toda vez que a pessoa entrar em um site, o nome do político que tem problema com a Justiça vai ficar roxo e, passando o mouse, estarão todos os processos, com links.

E quais os próximos passos? 

Nós temos um objetivo, que são as eleições de 2018. Hoje já estão na nossa base de dados todos os deputados federais, senadores, governadores, presidente e ex-presidentes, e estamos trabalhando para colocar todos os ministros e todos os deputados estaduais do país. Além disso, nas eleições, todos que forem se candidatar pela primeira vez serão incluídos. Assim que a pessoa se registrar e estiver na base do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nós vamos puxar esse nome e varrer todos os tribunais, para informar ao cidadão que aquele candidato também pode ter alguma pendência com a Justiça.

O senhor acredita que o eleitor estará mais vigilante em 2018? 

Acho que o Brasil mudou. As próximas eleições serão diferentes. Acredito que 30% desses políticos que não deveriam estar ali porque estão “roxos”, com processos criminais, de improbidade, não serão eleitos. Não só por causa da nossa ferramenta, é claro, mas ela vai ajudar muito. Nunca se viu tanta barbaridade, e essa ferramenta vai compilar essas informações, daí esse indicador de 30%.

Muitas pessoas estão descrentes com a política. Ainda assim o senhor acha que elas podem se engajar? 

Essa é a nossa esperança. O cidadão não pode mais não se lembrar em quem votou. E nós vamos fazer com que ele se lembre. Navegando na rede, com o plug-in, você vê que tal político é “roxo”. Isso é aceleração da informação.
O Tempo

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