sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

Jerusalém, sua sina infinita

Amadeu Garrido de Paula

És tu, Jerusalém, o sol, a lua, as estrelas e a saga da história. Em ti os mercadores profanaram o templo. Mercadorias e dinheiro são adversários do espírito. Ao afugentá-los, apoderado de sua ira santa, o Homem constituiu sua cruz. Naquele momento selou seu destino.

No domingo exortou o símbolo dos ramos. Talvez nada mais nos sensibilize que os ramos das árvores. São seus braços, seus dedos, suas bocas. Os extremos das florestas e das trilhas. Podemos aplacar nossos anseios ao abraçar ou agitar os ramos. Diversos, de cores várias, emanadas do verde. Jerusalém, uma semana depois dos ramos viste o início da semana de sangue e sofrimento.

Tudo até a tragédia de sexta-feira magna. Poderia ser uma segunda, ou uma quarta; mas a sexta é o fim e o princípio. O exército romano se tornava mais selvagem às sextas, em que todos querem descansar e os amantes amar. Nada mais adequado para provocar as tropas de choque, privadas de seus sonhos.

Nos degraus de seus templos e em suas vielas, que já imaginavam velhas, um Homem se preocupava com a humanidade. E com seu mistério. Com certeza ela tinha dúvidas. Por isso não escrevia, salvo na areia, para o vento apagar. Deus não escreve. Provavelmente, deixou essa tarefa para alguns escolhidos: Virgílio, Dante, Miguel de Cervantes, Camões, De Quincey, Stevenson, Dickens, tantos outros. Entre nós, o jovem Álvares de Azevedo, que morreu de tanto amar; o reflexivo Machado; os Andrades, o indignado Castro Alves, nossas mulheres maravilhosas, Cecília, Clarice, Lígia, Renata, quase todas inconformadas, felizes em suas profundas tristezas coloridas.

Jerusalém, foste tomado com sangue na guerra dos seis dias. Li os jornais durante todos eles, até a vitória, que não poderia ser dos mais fracos. Mas, aos destruidores do mundo, ficaram os buracos oriental e ocidental. A Cisjordânia e a Faixa de Gaza permaneceram pontiagudas em sua cabeça e em seus pés. Os palestinos, no seio de ti, Jerusalém, defenderam-se com pedras.

Pedras que escreveram tua implacável história. Gibbon descreveu magistralmente a queda de um império tresloucado, pleno de lutas pelo poder e de intrigas. Até tu?, eis a mais profunda expressão da crise de confiança entre os homens. Alguém, neste momento, segue os passos de Gibbon, descreve a deterioração de um rei patológico, desatinado, e de um reino, que deu-te de presente, Jerusalém, estalando as madeiras da fogueira, para quem a tomou de seus pobres crentes.  Mais uma vez, Jerusalém, estás a determinar o declínio e a queda de um império, algo sem razão de ser num mundo de todos.

Amadeu Garrido de Paulaé Advogado, sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados.

Esse texto está livre para publicação.

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