domingo, 4 de março de 2018

Diversas vias para chegar aos leitores


Nos últimos anos, tem se multiplicado a oferta de atividades e ações que permeiam o universo da literatura e dos livros. Feiras literárias, oficinas, bate-papo com autores, clubes de leitura, oficinas e saraus, além da tradicional contação de história, são algumas das possibilidades de abordagem que cada vez mais se diversificam. Bom para o leitor que pode, entre essas várias opções, eleger as mais atraentes e adequadas a seus interesses.

Bruna Kalil Othero, que é autora, pesquisadora e uma das organizadoras do Sarau Libertário, promovido a cada dois meses no MM Gerdau – Museu das Minas e do Metal –, localizado na praça da Liberdade, observa como esse cenário contribui para contemplar diferentes tipos de público. “Eu já fui algumas vezes aos encontros do projeto Leia Mulheres BH, promovido no Sesc Palladium, e encontrei um público muito grande que está disposto a discutir, compartilhar impressões sobre literatura, entre outros assuntos. Mas, talvez, algumas dessas pessoas não curtiriam outra proposta diferente dessa. Então, eu acho que ter essa diversidade é muito importante, e quem está ganhando com isso é a cidade”, pontua ela.

Mesmo entre alguns segmentos, como os saraus, a heterogeneidade é grande. Há cerca de oito anos, por exemplo, existe o Sarau Vira Lata, que atrai poetas de várias origens. E no caso do Sarau Libertário, realizado desde 2016, Bruna relata que vem se experimentando uma interseção entre a poesia, a música e, mais recentemente, o teatro. “Eu faço a curadoria junto com o Octávio Cardozzo, que é músico. Então, nós convidamos pessoas da literatura e também da música. Este ano, vamos ter o Bremmer Guimarães também na curadoria, e ele vai chamar pessoas ligadas ao teatro. A partir disso, escolhemos um tema para ser debatido. Já levamos a debate questões como diversidade de gênero, racismo, machismo, entre outros assuntos conectados ao que estamos vivendo hoje na sociedade”, completa Bruna.

Ela ressalta que essas iniciativas não só permitem ao público conhecer autores e artistas em atividade como revelam “a viabilidade de um texto ser trabalhado de várias formas”. Eliane Parreiras, que é gerente geral de cultura do Sesc em Minas Gerais, também sublinha a transversalidade em torno dos muitos projetos tocados pela instituição.

“A primeira coisa é o entendimento de que nós podemos estimular a leitura e a formação do leitor por meio de uma estratégia transversal e multidisciplinar. Ou seja, nós não buscamos esse objetivo apenas abordando o objeto livro, mas por meio de outras formas de contato com a literatura. Outro aspecto é que não entendemos a leitura apenas como interpretação de texto, mas como compreensão de vida, de ampliação de repertório. É a partir dessa crença que a gente chega nos nossos diversos formatos”, explica Eliane.

Entre as ações do Sesc, figuram bibliotecas móveis, que circulam pelas periferias de Belo Horizonte e pelo interior do Estado; exposições literárias; e o projeto Caro Leitor, do qual participará a autora Djamila Ribeiro, no dia 7. O último baseia-se no modelo de diálogo com escritores, que já há algumas décadas é praticado na capital mineira.

Palestra. Uma das iniciativas mais recentes desse eixo é o Letra em Cena, com curadoria de José Eduardo Gonçalves, que também foi idealizador do Ofício da Palavra. Este último existiu durante nove anos no Museu de Artes e Ofícios, e voltava-se à literatura contemporânea, diferentemente do primeiro que busca aproximar os leitores dos clássicos.

Nesta quarta-feira, por exemplo, a temporada de 2018 do Letra em Cena será inaugurada com uma palestra sobre Graciliano Ramos, a ser realizada pelo professor Wander Melo Miranda.

“A ideia é pensar por que é importante ler Machado de Assis hoje, o que ele tem a nos dizer? Da mesma forma indagamos sobre a obra de Graciliano Ramos que vamos apresentar na próxima semana. Como o trabalho desses autores dialoga com temas atuais? Esses são apenas alguns dos links úteis para tornar a literatura algo mais presente na cesta básica do brasileiro”, diz Gonçalves.

Em abril, algumas novidades também vão ser lançadas no Guaja. Uma delas é o início das atividades de um clube de leitura que terá como ponto de partida a biografia da artista mexicana Frida Kahlo (1907-1954). “A intenção é que sejam contemplados temas ligados às grandes personalidades mundiais. Haverá uma facilitadora que vai fazer uma exposição sobre a obra de Frida Kahlo, o que deverá estimular o debate. Como nós vamos sempre focar personagens muito conhecidos, não será exigida a leitura completa da biografia, o que a gente quer é também estimular a leitura a partir do bate-papo”, conta Paola Carvalho, editora de conteúdo do Guaja. Neste mesmo espaço, a partir de abril, terá início uma série de encontros com autores locais, entre eles os escritores Marcela Dantés e Jacques Fux. Batizado de As Pílulas de Chama, o projeto é desdobramento da revista “Chama”, que é especializada na produção literária brasileira.

“Nós queremos aproximar os leitores, principalmente de Belo Horizonte, dos nossos autores. E a proposta é permitir que os autores também possam apresentar trechos de textos inéditos que deverão sair em breve”, detalha Flávia Denise, que dividirá a curadoria com a escritora Val Prochnow.

À frente do Sempre um Papo, que está na ativa desde a década de 80, Afonso Borges ressalta a importância da periodicidade para garantir a eficácia dos programas de incentivo à leitura. “O hábito da leitura deve ser trabalhado de forma contínua, porque sem uma continuidade não é possível criar esses tipos de laço. A literatura hoje também concorre com muitos outros meios, então o desafio é grande”, observa ele. Ao comentar sobre o sucesso de propostas como o Sempre um Papo, Borges frisa a responsabilidade de lidar com esse trabalho a partir de um olhar social e humano. “Se você fizer um encontro com o autor apenas para cumprir tabela, há grandes chances de que isso não vai dar certo. O mais importante nisso é criar um evento baseado no afeto”, conclui.
O Tempo

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