quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Como é bom sair do labirinto tributário

Amadeu Roberto Garrido de Paula

A notícia de que o governo federal pretende simplificar nosso sistema de custeio do Estado mastodôntico é a mais alvissareira dos últimos tempos, em par com as privatizações. Somente se espera que o infame presidencialismo de coalizão, de coligação ou de cooptação, não atrapalhe, e que na ideia de simplificação não venha nenhum embuste que encareça a já impossível vida dos contribuintes brasileiros.

Em direito, chamamos de obrigação de dar quando temos, por exemplo, o dever de pagar, de dar certa quantia em dinheiro; e obrigação de fazer, relativa ao nosso dever de fazer algo, como, por exemplo, o de pintar um quadro para cuja tarefa fomos contratados. Em direito tributário, dá no mesmo: obrigação de pagar os tributos (impostos, contribuições gerais e contribuições de melhoria). No Brasil, somam-se as angústias: pagar e saber recolher, e como fazer, nessa Babel de deveres de procedimentos. A consequência tem nomes: insegurança jurídica, ansiedade, neuroses, um cadinho de infelicidades que o Estado todo poderoso, ainda que dito democrático, acarreta aos mais aquinhoados e talvez muito mais aos mais simples, sem assessores. Na contramão da felicidade da nação que é o objetivo do direito e do Estado.

Reduzir de 9 (eram 10, já meteram a colher), para um, imposto sobre valor agregado ou seja lá que nome tiver, é muito bom, pois, se nossa carga tributária não for reduzida, pelo menos nossos encargos diários, mensais ou anuais de condutas cuja inconsciência pode gerar multas, juros, correção etc, são afastados. Em verdade, são muito mais de 9, mas comecemos.

O fato não é só brasileiro e não é novo.

O grande Ítalo Calvino, em uma pequena obra de ficção cujo título mais parece o de um artigo de jornal de economia - "A especulação imobiliária", assim falava da Itália de seu tempo sobre os impostos: " ... A preocupação de não ter no mundo nem a décima parte para pagá-los (os impostos) e o atávico rancor dos agricultores lígures parcimoniosos e antiestatistas contra o Fisco, e ainda a eliminável acrimônia dos honestos que se consideram os únicos seres massacrados pelos impostos,  "enquanto os grandes, como se sabem, sempre conseguem escapar", e mais a suspeita de que houvesse naquele labirinto de cifras uma arapuca evitável, mas que só nós desconhecemos, todo esse torvelinho de sensações que os pálidos carnês de impostos suscitam nos contribuintes mais imaculados se misturava com a consciência de ser um mau proprietário, incapaz de fazer render os próprios bens..."

Uma primeira notícia melhorzinha (há de ver-se), depois de "não sei", "não foi encontrado" etc, falas de seres do mundo encarregado de manipular nosso dinheiro, que diuturnamente nos deprimem.

A simplificação também poderá ser transparência, mas há ainda um ponto na consciência de governantes que parece não ter sido despertado: quanto menores as alíquotas, maior a capacidade contributiva, o esquecimento do "camponês ligúrico" e o recolhimento espontâneo de tributos, cujo retorno, por óbvio, possamos ver. Não se trata de reforma tributária (ponto de prova quando cursava direito, em 1974), apenas de um aspecto, mas que pode alimentar alguma esperança, num mundo de notícias invariáveis que só nos provocam náuseas.

Amadeu Roberto Garrido de Paula, é Advogado e sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados.

Esse texto está livre para publicação.

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