segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

Karl Marx: jornalista, marido e pai

O TEMPO

LITERATURA



Celebrada biografia escrita por Gareth S. Jones vai do nascimento, na Alemanha, até a morte, na Inglaterra

PUBLICADO EM 12/02/18 - 03h00




RIO DE JANEIRO. No centenário da Revolução Russa, chegou ao Brasil no fim de 2017 uma celebrada nova biografia de Karl Marx, escrita por Gareth S. Jones, ex-professor de Cambridge e ex-editor da revista “New Left Review”. Em “Karl Marx: Grandeza e Ilusão” (Companhia das Letras, 768 págs., R$ 79,90) acompanhamos o protagonista, chamado sempre de Karl, desde seu nascimento em Trier, Alemanha, em 1818, até sua morte em Londres, em 1883, passando por Berlim, Paris, Bruxelas e Colônia, acompanhado de sua esposa, a aristocrata Jenny von Westphalen, com quem foi casado por 37 anos, até a morte dela.
A leitura propicia vários ângulos de visão sobre a personalidade de Marx. Durante a juventude, quando se dedicou à poesia, caracterizava-se por “ensimesmamento solipsista” e “presunção beletrista”. Mais tarde, seu amigo Arnold Ruge disse que era “perfeito como erudito e escritor mas completamente desastroso como jornalista. Lê muito; trabalha com uma intensidade incomum (...) mas não termina nada, interrompe tudo e volta a mergulhar num oceano de livros”.
Em Londres, a família viveu em penúria, todos sempre doentes e devendo dinheiro aos amigos. Quatro de seus filhos morreram nessa época e um outro, filho de Marx com sua empregada, foi entregue para adoção. Apesar do relacionamento extraconjugal, uma testemunha afirmou que “como marido e pai, Marx (...) é o mais delicado e meigo dos homens”. O ambiente da casa não era dos mais saudáveis: “Em todo o apartamento não existe um único móvel sólido e limpo. Tudo está quebrado, esfarrapado e rasgado, com meia polegada de poeira a cobrir tudo, e a maior bagunça em toda parte.”
“Karl Marx – Grandeza e Ilusão” não pretende ser um manual de marxismo, mas uma história das ideias de Marx e de como elas influenciaram e foram influenciadas pelo ambiente em que ele viveu. Para isso, dedica-se a analisar não somente as obras que ele estudou e as organizações políticas das quais participou, mas também os eventos e temas que estavam em discussão na época, as pessoas com as quais conviveu e o que elas diziam e pensavam.
Lemos portanto muito sobre direito, história, política, religião, economia e filosofia e acompanhamos os debates e disputas com figuras como Bruno Bauer, Arnold Ruge, Ludwig Feuerbach, Moses Hess, Pierre-Joseph Proudhon, Karl Grün, Andreas Gottschalk, Ferdinand Lassalle, Mikhail Bakunin e, claro, Friedrich Engels.
É possível acompanhar o pensamento de Marx se modificando ao longo do tempo, e Gareth Jones enfatiza isso, especialmente no último capítulo. Por exemplo, a ideia de que o capitalismo se desenvolveria no mundo todo, inexoravelmente, foi cedendo espaço à possibilidade de que sociedades antigas, como a russa e a indiana, poderiam achar outros caminhos. O autor ressalta a importância de Engels não apenas como amigo e provedor financeiro da família Marx, mas também como formatador do que seria conhecido como marxismo (alegando, por exemplo, um suposto paralelo com o darwinismo), principalmente pela publicação de “Anti-Dühring”, que se tornou a fonte mais popular para a compreensão dessa teoria e a transformou em uma ampla “concepção de mundo”.
Marx morreu antes de terminar os dois volumes finais de sua obra magna, “O Capital”, que foram editados e publicados postumamente, por Engels. A última frase do livro resume a visão de Jones a esse respeito: “O Marx construído no século XX tem uma semelhança apenas fortuita com o Marx que realmente viveu no século XIX”.
O Tempo

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