sábado, 10 de fevereiro de 2018

Com a democracia em crise, façamos da esperança nossa luta permanente

O TEMPO

Acílio Lara Resende




PUBLICADO EM 08/02/18 - 03h00

O filósofo Mario Sergio Cortella é um exímio minerador da palavra. Impressiona-me seu vigor intelectual. Em suas palestras, sempre deixa algumas pérolas. Fiz questão de guardar uma delas, não completa, mas somente parte. Ela me ajuda a dizer o que de fato desejo.

“O pessimista – afirma Cortella – é, sobretudo, um vagabundo. Dá um trabalho danado ser otimista. Tenho que ir atrás, estudar. A frase preferida do pessimista é esta: ‘Que horror!, alguém tem que fazer alguma coisa’. Isso porque a única coisa que o pessimista faz é sentar e esperar dar errado. Quando ainda não deu errado, diz: ‘Espere que você vai ver’. É tão bom ser pessimista! Assim, você pode atribuir o que acontece a você e ao país a forças que estão fora de nós. Eles, os ‘patifes’ (referindo-se aos políticos), não vão levar minha esperança”.

Veja as coincidências, leitor. Ao folhear a revista da Academia Mineira de Letras, dei com a homenagem do escritor Luís Giffoni a seu confrade José Crux Rodrigues Vieira, já falecido. O título – “José Crux Rodrigues Vieira e a permanência da palavra” – lembra Carlos Drummond de Andrade: “Lutar com palavras/ é a luta mais vã./ Entanto lutamos/ mal rompe a manhã”. José Crux foi colega de faculdade de meu irmão Otto Lara Resende. Romancista, historiador, professor, advogado, delegado, redator e assessor da Assembleia Legislativa, foi ainda diretor geral da Câmara Municipal de Belo Horizonte. Foi, também, prefeito de Muzambinho e Formiga. Deixou grande obra sobre a Inconfidência Mineira (“Tiradentes: A Inconfidência Diante da História”). Virgínia Moretzsohn Rodrigues Vieira, viúva de José Crux, é irmã do meu grande amigo, colega e compadre, já falecido, Orlando Moretzsohn Filho.

Revela-nos Luís Giffoni que José Crux fez seu primeiro poema aos 16 anos, e sua palavra-síntese é a esperança: “Mas, disso descubro/ uma nova semelhança:/ da tristeza da saudade/ nasce sempre uma esperança”. Sessenta e um anos depois, em 1997, em seu último poema, “Eco Bendito”, o poeta confirma o que disse Giffoni: “Caminheiro, levanta-te da queda,/ ergue os olhos ao alto da amplidão/ e rumo à aurora, segue, vai, avança./ Nem espinho, nem vala a marcha veda:/ quando teu canto esmaga a solidão, o eco bendito escutas da esperança!”.

O que estou trazendo aqui, leitor, tem tudo a ver com o momento político no qual mais sofremos do que vivemos. Uma eleição vital para o país se aproxima. O Brasil não pode continuar preso a pessoas ou a projetos pessoais. As lideranças, numa política honesta, só são válidas enquanto nos servem. E – o que é mais importante – não podemos perder, nunca, a esperança. Precisamos, então, defender projetos políticos que possam ser competentemente tocados pelo mais comum dos mortais. Precisamos, na verdade, de um bom script e de um bom intérprete. Fujamos daqueles que se consideram imunes ao pecado ou defensores especiais da moral pública. Esses são os que mais traem.

A democracia está em crise no mundo todo. Só não vê quem não enxerga. O escritor português José Eduardo Agualusa, em sua última crônica no “O Globo”, após se referir ao “Índice de Democracia” do jornal britânico “The Economist”, recentemente divulgado, disse que “a má notícia é que a democracia recuou no mundo”. “Com o recuo, cresce a pobreza, cresce a desigualdade, o ódio e o rancor. Não sei qual a solução para reverter o processo. Sei que é urgente refletir sobre isso”, completou.

E antes, leitor, que a tormenta nos alcance!
O Tempo

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