sexta-feira, 6 de abril de 2018

Lula, a vontade coletiva e o culto da personalidade


O jurista Amadeu Garrido, discorre no texto abaixo sobre o momento histórico que vive o País com a prisão do ex-presidente Lula, por corrupção comprovada. Hoje o brasileiro da demonstração do equívoco de perder as esperanças, visto que este acontecimento histórico transforma nossas vidas para melhor.


Amadeu Garrido de Paula

Um dos mais argutos filósofos, de certo modo desconhecido, Frans Schopenhauer, sustenta que a vontade é o motor (coisa-em-si) de tudo quanto existe, natureza, homem, humanidade; não se trata da vontade individual de comer, por exemplo, mas da grande vontade que movimenta todos os fenômenos. Expôs o filósofo sua teoria num dos mais preciosos livros dos dois últimos séculos, denominado  "O mundo como vontade e como representação".

O problema é que a vontade, voltada ao melhor mundo possível, como dizia seu colega Leibniz, é constatada, no mundo real, com sua negação reiterada. A vida proporciona tristezas que são mais contundentes, e perduram mais em nossas memórias, que os passageiros momentos de alegria. Estes são muito mais fugazes, passageiros. Todos sentimos que é assim mesmo.

A humanidade fica mais sujeita aos sofrimentos, que marcam a existência geral. Por isso, nosso pensador foi conhecido como o filósofo do pessimismo, o que deve ter justificado a fuga de seus seguidores, porque todos nós queremos ser felizes e temos medo das tragédias. Qual a razão de viver um mundo de sofrimento? Entretanto, no exame profundo de sua filosofia, vemos conceitos perturbadores dessa simples desolação: conhecer a verdade faz com que o homem conviva com os ventos contrários; e aprofundar nossa felicidade, torná-la possível em cada momento da vida, é nossa grande luta para escapar daquela vontade fundamental e incontrastável, metafísica, da "sofrência".

Decorre que nenhum homem, por seu carisma, por sua capacidade de comunicação às grandes massas, por sua vocação à liderança, consegue transformar esse estado de coisas, que é dependente de cada um de nós, não de um outro homem, por mais poderoso que seja.

Consequentemente, o culto da personalidade é uma redução ao absurdo de nossa consciência. Alienamo-nos e deixamos a outrem o encontro de nossa felicidade.

Fés religiosas como as que encontramos no budhismo, no brahmanismo, no catolicismo, condenam o culto da personalidade. No entanto, o homem, em sua fragilidade psíquica e espiritual, em sua história, busca o nirvana, a terra prometida, o paraíso, na ação política de outros homens. Os tempos mais recentes conviveram com o culto à personalidade de Vladimir Lênin, Joseph Stálin, Adolph Hitlher, Mao Tsé Tung. Todos os resultados frustrantes do acontecimento dito como AQUELE QUE VIRÁ, MAS QUE NUNCA VEIO E NÃO VIRÁ, estão aí, devidamente registrados.

No Brasil, talvez não pudéssemos fugir do fenômeno. Conhecemos os episódios de Antonio Conselheiro, Padre Cícero e, em tempos modernos, a adoração de Lula, por expressiva parte da população, especialmente do sofrido nordeste. Este último atinge o término do culto, que não poupou nenhuma das personalidades veneradas, do modo menos nobre possível, prisão por corrupção comprovada. O homem endeusado, em seu íntimo, tinha fragilidades que vontades coletivas não poderiam admitir.

                                                   
É provável que hoje seja seu primeiro dia de encarceramento. O culto transforma-se numa peça teatral de tragédia, encenada por seus adeptos, que fazem do acontecimento algo extraordinário e que confirma a percepção do filósofo alemão: o mundo objetivo é feito de ilusões, que somente cada um de nós pode desfazer, por meio do conhecimento do real e das práticas menos gananciosas, satisfeitas nossas necessidades materiais razoavelmente, como a arte em geral, a poesia, a música, a pintura, a arquitetura, enfim de tudo aquilo que pode transformar nossas vidas para o bem, independentemente de esperarmos um milagre a cargo de um outro ser humano, tão limitado como nós.

Hoje é o dia brasileiro da demonstração do equívoco das esperanças vãs, do culto da personalidade e de um dia sublime, em que um notável acontecimento histórico transformaria para melhor nossas vidas.

Amadeu Garrido de Paulaé Advogado, sócio do Escritório Garrido de Paula Advogados.

Esse texto está livre para publicação.

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