terça-feira, 14 de junho de 2016

Mal da ansiedade afeta mais que a depressão

Augusto Cury é, de longe, um dos psicólogos e psiquiatras mais conhecidos do país. Autor de diversos livros, todos best-sellers, em que ensina inteligência emocional, ele agora está com foco na gestão da ansiedade. “Antes, nós achávamos que o mal do século fosse a depressão. Mas a depressão atinge de 15% a 20% das pessoas em todo o mundo. Já a ansiedade, principalmente a causada pela Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA), atinge de 70% a 80% das pessoas em todo o mundo”, constata.

Em Belo Horizonte para ministrar uma palestra com o tema “Ansiedade: como gerenciar e enfrentar o mal do século”, ele falou à reportagem de O TEMPO sobre os principais sintomas do problema, as causas e, principalmente, sobre como lidar com ele. Abaixo, selecionamos os melhores trechos dessa conversa.

Como gerenciar e enfrentar a ansiedade? 

Primeiro, precisamos definir o que é ansiedade. Existe a ansiedade saudável, que nos motiva, nos estimula a vencer os desafios. E existe a ansiedade doentia, que gera sintomas psicossomáticos, como dores de cabeça e musculares, baixo limiar para frustrações, irritabilidade, agressividade, preocupações excessivas, autopunição, cobrança exagerada de outras pessoas e assim por diante. Gerenciar a ansiedade doentia passa por uma série de ferramentas, como aprender a se colocar mais no lugar do outro, contemplar o belo, pensar antes de agir, desacelerar o pensamento, criticar cada ideia perturbadora.

O senhor pode explicar melhor essa técnica de criticar as ideias? 

Toda crença pode ser saudável ou aprisionante. Se elas são saudáveis, nos estimulam a conquistar pessoas, ter a autoestima sólida. Se a crença é doentia – se sou escravo da minha timidez, penso que ninguém gosta de mim, que estou fadado ao fracasso etc. –, precisa de uma chave que a descaracteriza como uma prisão. É a arte da dúvida. A pessoa tem que duvidar do controle da timidez, criticar sua insegurança, determinar ser mais alegre, ousada e criativa.

Práticas como ioga, meditação, alguma atividade artística também são benéficas?

A meditação, andar descalço na terra, ter contato com a natureza, cuidar de animais, tocar uma música – todas essas atividades podem contribuir para aliviar as tensões. Mas somente ter um hobby não adianta.

No dia a dia, de que forma a ansiedade interfere na vida? 

A maioria dos seres humanos não sabe lidar com as próprias emoções e pilota pessimamente a própria mente. Não sabem ser líderes de si mesmos. E, quem não é líder de si mesmo, nunca o será de forma satisfatória no cenário social, como educador, executivo, profissional liberal, até parceiro em um relacionamento.

A liderança, então, interfere até mesmo nas relações?

Sim. Não basta amar com emoção. Tem que amar com grandes doses de inteligência. Investir nos sonhos do parceiro, aplaudir cada acerto e não ficar apontando falhas, não ter a necessidade neurótica de tentar mudar o outro são ferramentas que ajudam no amor sustentável e inteligente. Para quem ama sem gestão da emoção, tem romances que começam no céu do afeto e terminam no inferno dos atritos.

A ansiedade atinge cerca de 70% a 80% da população mundial. Isso significa que nem as crianças e os adolescentes estão escapando?

Essas crianças e esses adolescentes estão adoecendo, e ninguém está fazendo nada para ajudá-los. Uma criança de 7 anos, hoje, tem mais informação do que um imperador romano. Assim, os smartphones são uma das principais causas da Síndrome do Pensamento Acelerado. E os médicos estão confundindo essa síndrome com hiperatividade e receitando Ritalina de forma indiscriminada.

Muitos dos diagnósticos de TDAH, então, são, na verdade, uma faceta da ansiedade não controlada?

É um erro de diagnóstico atroz. Cerca de 1% a 2% da população mundial é hiperativa porque tem herança genética para tal. O resto são pessoas criadas por um sistema consumista que valoriza o ter em vez do ser, que leva as pessoas a se conectarem com milhares de outras pelas redes sociais, mas não se conectarem consigo.

Quem não consegue administrar as emoções e ser líder de si mesmo não conseguirá ter uma posição de liderança na sociedade?

Quem ensina suas crianças e seus adolescentes a fazer essa gestão da emoção está fazendo um investimento para que se tornem profissionais capacitados para terem sucesso em uma sociedade de poucas oportunidades. Grande parte das crianças, dos adolescentes e dos universitários vai sair com um diploma nas mãos, mas completamente despreparada para ser autor da própria história. É uma desvantagem competitiva enorme não ter uma educação sócio-emocional.

Isso é algo que deve ser ensinado nas escolas? 

Os diretores de escolas precisam acordar para o novo modelo de educação, da escola da inteligência. É um programa que tive a oportunidade de desenvolver e que prevê uma aula por semana para ensinar às crianças e aos adolescentes a gestão das emoções. Algumas escolas, inclusive em Belo Horizonte, já estão se programando para começar a aplicá-lo a partir do ano que vem.
O Tempo

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